E: empregador

Teoria

E: empregador

Ao substituir “patrão” por “empregador”, o capital pretende mais do que esconder o conflito entre as classes e diluir a carga histórica e política das palavras: o principal propósito aqui é mostrar a exploração como uma inevitabilidade económica. “Se os empregadores não criassem empregos, não havia trabalhadores” é a conclusão a que chega quem aceitar este termo.

A realidade, porém, é inversa: é possível haver trabalho sem patrões, mas não é possível haver patrões sem trabalhadores. A história está repleta de exemplos bem sucedidos de sociedades, mais ou menos desenvolvidas, de milhões de trabalhadores a trabalhar sem patrões. Para o trabalho ser possível são necessários meios de produção, trabalhadores e organização, que toma sempre as formas mais convenientes à classe dominante.

Gestores, contabilistas, economistas e técnicos de recursos humanos são, todos eles, trabalhadores. A propriedade privada dos meios de produção significa que os trabalhadores vêem a riqueza que criam ser apropriada pelo titular improdutivo da propriedade, o patrão. Como os seus interesses são privados, o que convém ao patrão é frequentemente contrário ao que convém à empresa, aos trabalhadores, ao país e ao progresso. Por vezes, é mais lucrativo para o patrão vender uma fábrica viável a um investidor estrangeiro que a vai encerrar. Por vezes, é mais lucrativo não cultivar terras, falir um banco ou despejar leite no mar. Se empregar pessoas determinasse o que fazem os “empregadores”, eles abdicariam dos seus lucros para empregar mais pessoas, o que reduziria a taxa de desemprego e ainda nos permitiria a todos trabalhar menos horas.

Há uma guerra pelas nossas palavras. Elas são os instrumentos com que explicamos o mundo e a história ensina-nos que só o consegue transformar à sua vontade quem o consegue explicar. Da mesma forma que os negreiros tinham o cuidado de separar os escravos em grupos que não falassem a mesma língua, o capital verte milhões em campanhas de confusão conceptual, na promoção de novas categorias, na erradicação de certos vocábulos e na substituição de umas palavras por outras, aparentemente com o mesmo sentido. Este dicionário é um instrumento rápido para desfazer algumas das maiores confusões semânticas, conceptuais e ideológicas dos nossos tempos.

3 Comments

  • Rita Gil

    5 Junho, 2021 às

    É tão bom terem impedido a publicação do meu comentário anterior. Obrigada pela censura.

  • Rita Gil

    4 Junho, 2021 às

    Por acaso existe bastante a acrescentar e seria conveniente situar historicamente a construção disso que se designa por relação de emprego. O capital não precisa de uma relação de emprego tal como fora construída pela conquista de espaço e direitos políticos, sociais e civis pelos trabalhadores. Ao capital, basta-lhe o mercado, e nesse as relações de emprego são aberrações, precisamente porque desmercadorizam o trabalho. Patrão é uma coisa, empregador é outra. Uma está no domínio da determinação económica da relação social de produção, o outro está no domínio da determinação superestrutural dessa relação. Uma é o sujeito de mercado no seu estado puro, a outra é o sujeito jurídico-político resultante de uma construção socio-histórica que visou proteger o trabalho. Às vezes, uma e outra são personificadas na mesma “pessoa económica”, a maior parte das vezes, no capitalismo financeirizado, não o são. De todas as lutas que o trabalho tem hoje para travar com o capital, não é uma delas o fim da relação de emprego. Os perigos existem, aliás, no seu fim, no retorno ao mercado puro. Era bom ter cautela. Às vezes quando se dispara para todo o lado, acerta-se no próprio pé.

  • Vitor Mendes

    4 Junho, 2021 às

    Nada mais existe a acrescentar. Clarinho como a água.

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