F: flexibilidade

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F: flexibilidade

Flexibilidade é o termo que, no linguajar dos capitalistas, designa a disponibilidade dos trabalhadores para serem mais explorados.

Na novilingua do empreendedor, a flexibilidade é uma ginástica que só praticam os trabalhadores, que devem estar ainda mais disponível para trabalhar mais horas e assumir mais tarefas.

Por seu turno, os patrões que enchem a boca com a flexibilidade dos trabalhadores são empedernidamente inflexíveis em relação aos seus lucros, a aumentos salariais, a reconhecer mais direitos a quem trabalha e a reduzir os horários de trabalho.

À capacidade dos trabalhadores de suportarem esta contradição os patrões chamam resiliência.

Há uma guerra pelas nossas palavras. Elas são os instrumentos com que explicamos o mundo e a história ensina-nos que só o consegue transformar à sua vontade quem o consegue explicar. Da mesma forma que os negreiros tinham o cuidado de separar os escravos em grupos que não falassem a mesma língua, o capital verte milhões em campanhas de confusão conceptual, na promoção de novas categorias, na erradicação de certos vocábulos e na substituição de umas palavras por outras, aparentemente com o mesmo sentido. Este dicionário é um instrumento rápido para desfazer algumas das maiores confusões semânticas, conceptuais e ideológicas dos nossos tempos.

3 Comments

  • Rita Gil

    9 Junho, 2021 às

    Gostava tanto que este serviço público fosse bem feito. Tanta literatura sobre o modo como as organizações capitalistas se flexibilizam para fugir à alegada “rigidez” do direito laboral e da contratação coletiva, e aqui resume-se a flexibilidade à da gestão direta do trabalhador. A flexibilização das organizações capitalistas, caro António Santos, começou com o desmantelamento da noção de empresa (e, já agora, de proprietário e empregador). Repare você que a empresa é uma aberração para um verdadeiro liberal. Atente à palavra: em presa. A empresa prende no seu próprio interior, é formada pela produção interna em vez do recurso ao mercado externo, o que a obriga ao compromisso laboral coletivo. A sua flexibilização começou por libertar dessa presa o capital em si mesmo (antes mesmo dos trabalhadores), com as transformações ao sistema financeiro, que aconteceram num período em que países como Portugal procuravam ainda a incorporação de princípios socialistas na governação macroeconómica e laboral. Quando nós tentávamos trazer o trabalho para dentro da empresa – retirando-o do mercado selvagem e protegendo-o da arbitrariedade gestionária – já o capital estava escondido atrás das noções abstratas de títulos e ativos financeiros. Todos eles vão dar ao lugar da produção, haja pachorra para os rastrear, e encontrar o proprietário desaparecido. Essa, António Santos, foi a maior flexibilização da empresa capitalista – fazer desaparecer o capital.
    Já agora, mais uma deixa à noção de empregador – é precisamente por isto, porque o capital se esfumou no espaço etéreo das transações virtuais e abstratas dos mercados financeiros, que é tão importante compreender a noção jurídico-política de empregador – esse alguém a quem os proprietários omissos delegam o exercício legítimo da posse (outro conceito tão importante na teoria marxista).
    A ginástica da flexibilidade é a especialização do capital. Está longe de ser uma prática exclusiva dos trabalhadores.

  • Alberto Jorge Lemos

    7 Junho, 2021 às

    Completamente de acordo e ficarei mais atento e informado.

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