O «doce pastel de nata»: quem o faz e quem o come

Nacional

«Doce como um pastel de nata». Foi com esta metáfora gastronómica que a revista The Economist se referiu recentemente à economia portuguesa, atribuindo-lhe o «melhor desempenho em 2025 entre 36 países maioritariamente desenvolvidos». O artigo é um mundo de elogios em catadupa: uma «combinação de crescimento do PIB acima da média europeia», a «inflação perfeitamente controlada» e uma óptima «valorização do mercado accionista», entre os factores que mais se destacam no famoso «desempenho» que coloca Portugal no top 40 do «sucesso económico» mundial. Resumindo e concluindo: isto está óptimo, uma maravilha. Só não disseram é para quem.

À medida que essa dita economia «prospera» e coloca o nosso país no top dos mais ricos do mundo, o rendimento mínimo e médio daqueles que a fazem funcionar e «prosperar», esse, não tira Portugal da cepa torta. Enquanto o PIB, a inflação e o mercado accionista nos colocam nos patamares «de excelência de desempenho económico», Portugal continua no desgraçado «top 10» de países com salário anual médio mais baixo na União Europeia, atrás de grandes «potências económicas» como a Eslovénia, a Lituânia, Malta, o Chipre ou a Estónia. Ou seja, como é bom de ver, uma coisa é quem come o «doce» pastel de nata, outra bem diferente é a amargura de quem o faz todos os dias.

Claro que Luís Montenegro, ufano e a precisar de abafar as diárias mostras de incompetência de quase todos os seus ministros, já aproveitou para se congratular com este «reconhecimento internacional excepcional». Falando numa «justa aclamação do mérito e do trabalho dos portugueses», esqueceu-se, porém, de um relevantíssimo pormenor: que o mérito e o trabalho estão de facto lá, no dia-a-dia de quem faz a economia avançar, mas a retribuição que por isso recebem continua teimosamente a ser das piores da Europa, e é assim há décadas. Por ele, já sabemos, a coisa é para se manter, ou tanto quanto possível, piorar.

O sistema, como vemos todos os dias e em toda a parte, não está concebido para redistribuir, antes para concentrar. Os ricos ficam mais ricos, os pobres cada vez mais pobres. Este glorioso «reconhecimento» da The Economist tem a solitária utilidade de vir ajudar a desmontar a narrativa da «falta de produtividade» dos portugueses como maleita da economia e do desenvolvimento do país. Estes elogios são apenas a demonstração da falácia que é o argumentário da «imensa malandragem», do «anda tudo a gamar», do país em que «ninguém trabalha», dos «muitos e muitos» que só vivem «de subsídios» e que são a causa para «o país não andar». O que estes números mostram é que os portugueses trabalham muito e trabalham bem. O problema é que o fazem para alimentar a parasitagem patronal, que não redistribui e que os explora, pagando-lhe salários de miséria, dos piores a nível europeu. Uma coisa é a realidade «próspera» de quem prova a «doçura» do pastel de nata que vale milhões. Outra, bem diferente, é a realidade dura de quem o faz por meia dúzia de tostões. Dia 11, há greve geral.

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