A greve dos trabalhadores da CML à recolha do lixo

Nacional

Alguém viu ou ouviu alguma notícia sobre a greve dos trabalhadores do município de Lisboa à recolha do lixo em que fossem claramente explicadas as razões que levaram estes trabalhadores à greve? Eu não vi. Admito que me poderá ter passado desapercebida, mas não vi, nem li, nem ouvi. Só na televisão vi umas sete ou oito peças. Dessas, apenas duas ou três referiam ao de leve que os trabalhadores estavam contra a descentralização de competências do município para as freguesias. Mas logo “explicavam” que António Costa garantiu que os trabalhadores não perderiam direitos e conservariam o seu vínculo por meio de lugares cativos no mapa de pessoal da Câmara. O que li e ouvi também não destoou desta linha.

As notícias sobre esta greve seguem o modelo das de outras greves: de trabalhadores dos transportes, da saúde, da educação e da administração pública em geral. Imagino que as redacções tenham uma espécie de minuta com os campos em branco a serem preenchidos com as especificidades da greve. Começam por anunciar que os trabalhadores estão em greve, e a duração da mesma. Passam rapidamente para os prejuízos causados. Recolhem testemunhos de pessoas que se sentem afectadas. Dão a palavra à administração que, em geral, minimiza a participação e explica que não há razões para ela. Quando dão a palavra aos sindicatos apenas publicam os dados da adesão e duas ou três banalidades.

São notícias que procuram criar uma imagem de irresponsabilidade, de arrogância e de desprezo por parte dos trabalhadores, que procuram desmobilizar mostrando a reprovação popular. Subtilmente sugerem que os trabalhadores são obrigados a trabalhar independentemente das condições laborais. Jamais revelam o que deveria ser óbvio: que a greve é a demonstração que sem trabalhadores não há produção, não há serviços, não há economia. O seu objectivo é, claramente, o de dividir os trabalhadores e de liquidar o direito à greve.

Acresce, neste caso particular, a este caldo de desinformação a participação do presidente da Câmara como participante habitual de um programa de televisão.

Pelo esclarecimento e pela verdade transcrevo aqui parte de dois comunicados da célula do PCP na CML, um de 20 e outro de 22 de Dezembro.

“Em defesa do serviço público Municipal e dos direitos dos trabalhadores!

Em Novembro do ano passado, foi aprovada a Lei 56/2012 da autoria do PS e do PSD que determinou a nova organização administrativa para Lisboa, suprimiu 29 freguesias e estabeleceu novas competências para as actuais 24 Juntas de Freguesias.

É importante relembrar que toda a reforma administrativa do País foi aprovada na Assembleia da República numa única lei. Lisboa teve um “tratamento privilegiado”, uma lei exclusiva, resultado de um processo de acordo de interesses próprios entre o PS e o PSD.

Ao contrário do que tem sido afirmado, o conjunto de competências a transferir para as Juntas de Freguesia que o executivo liderado pelo PS/António Costa submeteu à Câmara Municipal não está estabelecido na lei.

O que a lei determina é que a Câmara Municipal de Lisboa tem a competência para definir os «espaços, vias ou equipamentos de natureza estruturante para a cidade ou para a execução de missões de interesse geral e comum a toda ou a uma parte significativa da cidade».

Mas o PS/António Costa decidiu de outra forma. Decidiu pelo desmantelamento dos serviços municipais e pela dispersão de equipamentos com o propósito de se “livrar”, para já, de 1 800 trabalhadores e abrir as portas à privatização de um conjunto de serviços de interesse público.

É fácil verificar que a proposta hoje votada está baseada numa fundamentação escassa, aleatória, casuística e sem qualquer critério, uma falsa “descentralização administrativa” e de “proximidade”. Missões e competências para as quais as Juntas de Freguesia não têm meios, nem condições técnicas e financeiras para assumir.

(…)

1. Este processo de “descentralização” de competências decorreu de forma atrapalhada e pouco clara. Houve casos de “descentralização” imposta, em outros decorreu de um “acerto de interesses”, sempre sem qualquer quantificação dos encargos financeiros, de funcionamento ou de recursos humanos.

O executivo PS transfere espaços verdes, piscinas e pavilhões, bibliotecas e jardins de infância – e quem assegura a sua manutenção, ou o custo das obras que a CML não conseguiu, ou não quis realizar?

Quem assegura o acesso universal a estes equipamentos públicos municipais, sabendo que nem todas as Juntas de Freguesia os possuem?

Quem regula a igualdade dos preços e taxas de utilização a pagar pelos utentes?

(…)

O executivo PS, pela voz de António Costa, diz garantir “todos os direitos aos trabalhadores”.

Esta afirmação esconde a verdade!

E a verdade é que os trabalhadores irão pertencer aos mapas de pessoal das Juntas de Freguesia. No caso de quererem “voltar” à Câmara estarão sujeitos ao regime de mobilidade, durante um (1) ano. E depois o que lhes acontece?

Garante também António Costa que os trabalhadores continuarão a beneficiar dos Serviços Sociais. É fantástico o que António Costa afirma garantir! As Juntas de Freguesia têm os seus próprios órgãos de decisão. E se as Juntas de Freguesia decidirem não pagar aos Serviços Sociais a parte que compete à entidade patronal? E quando a composição das Juntas se alterar, como será?”

“Em mais do que um jornal de ontem, surgiram anúncios da Câmara Municipal de Lisboa assinados pelo Presidente António Costa.

O título desses anúncios pagos pelo dinheiro público é “Descentralizar não é privatizar” e tem subido a um canto a palavra “informação”.

Cumpre então dizer o seguinte:

1º Informar não é mistificar, dizer meias-verdades ou falar daquilo que ninguém nunca questionou. António Costa diz, sobre a passagem de trabalhadores para as Freguesias, que as estas são autarquias locais e a relação continua a ser de direito público, concluindo que por isso não há privatização. Ora, António Costa mostra neste curto considerando ser um verdadeiro artista. Pergunta-se: o que tem o vínculo dos trabalhadores a passar da CML para as Freguesias, com a privatização/externalização de serviços da CML?

2º Diz António Costa que os trabalhadores conservam os direitos adquiridos e que o município conservará os necessários lugares cativos no seu mapa de pessoal. A proposta que tem sido feita a Costa nesta matéria era a dos trabalhadores irem prestar serviço nas freguesias mantendo o vínculo ao município. O Presidente Costa rejeitou! Agora vem dizer que mantém lugares cativos no mapa de pessoal do município? Que sentido tem recusar a proposta feita e agora vir com esta conversa? Será que recusou só por teimosia? E achará Costa que pode manter lugares cativos a seu bel-prazer e pelo tempo que entender?

3º O Presidente Costa vem novamente dizer que a descentralização é uma lei da Assembleia da República e que houve duas eleições que apoiaram a descentralização, porque Costa ganhou. Mais uma vez Costa ludibria. Em lado nenhum foi aprovada ESTA descentralização. E é contra esta descentralização que está o PCP, estão os trabalhadores e estão também eleitos do PS que sussurram o seu desacordo.

Do exposto se conclui que o Presidente António Costa gastou dinheiros públicos em anúncios que não informam e ainda menos esclarecem. O Presidente Costa enfiou-se numa quadratura do circulo e quer arrastar com ele os trabalhadores e o serviço público municipal.”