Das falácias do Sr. Governador

Nacional

Carlos Costa, o homem-estátua do Banco de Portugal, o governador que ficará na história por nunca ter tido a coragem nem competência para afrontar, denunciar ou retirar a idoneidade aos grandes obreiros do desastre financeiro do BES apareceu agora, muito ufano e cheio de moral, para mostrar o quão forte e corajoso afinal sabe ser para com os trabalhadores e os desempregados. Em declarações a vários órgãos de comunicação social, no momento em que ainda se sente no ar o odor fétido de anos de inabilidade e inépcia do organismo que continua a dirigir (sem que se saiba ainda muito bem porquê), Carlos Costa pede uma “reforma laboral” que mais não é que um apelo à radicalização da austeridade e à diminuição dos já escassos apoios sociais.

Já que Carlos Costa tanto gosta de comparações cegas com o “que se paga lá fora”, por que não refere, por exemplo, que o governador do Banco de Portugal ganha mais 32% que o Presidente da Reserva Federal Americana?

Atirando aos quatro ventos, por um lado, a falaciosa cartada de que o subsídio de desemprego em Portugal tem uma duração superior “à média europeia”, esconde por outro, com esperteza saloia, que o valor que é pago aos desempregados em Portugal é muito inferior – tal como a pauta salarial média – à esmagadora maioria dos países europeus, só sendo aliás superior aos montantes pagos na Bulgária, na Eslovénia ou em Malta. A isto acresce ainda a constatação óbvia, mas evidentemente escondida, de que ficar em situação de desemprego em Portugal não é, nem de perto nem de longe, o mesmo que ficar desempregado noutros países da União Europeia. Carlos Costa bem sabe, mas omite do seu argumentário financeirista e cego, os demais apoios concedidos pelos vários estados em áreas como a saúde ou a educação, já para não falar na proporcionalmente menor carga de impostos, na ausência de taxas e taxinhas, que a pretexto de tudo e mais alguma coisa arrastam o cidadão desempregado para a privação de meios e de condições dignas de subsistência.

Por outro lado, e já que Carlos Costa tanto gosta de comparações cegas com o “que se paga lá fora”, por que não refere, por exemplo, que o governador do Banco de Portugal ganha mais 32% que o Presidente da Reserva Federal Americana? Por que não diz Carlos Costa que, no seu próprio ordenado mensal (mais de 15 mil euros), cabem 30,16 salários mínimos nacionais, 29,6 subsídios de desemprego (considerado o valor médio mensal) ou 165,8 prestações mensais médias do RSI? Perceberá ele a latitude das suas palavras e da ofensa que constitui pedir aos sacrificados que se sacrifiquem ainda mais? Perceberá ele a ignomínia das suas palavras proferidas do alto de toda a sua inabilidade enquanto governador e dessa sua faustosa remuneração? Não, não percebe. Certamente que não percebe. A menos que um dia este país lho faça perceber.