É mais um episódio a cair como “chicote feudal” no lombo do trauteio direitista da suposta iniquidade e suposto arcaísmo da luta de classes. De facto, está mais que provado, a negação e oposição organizada, corporativa e orquestrada à luta de classes como motor das sociedades e caminho da emancipação e libertação da humanidade, não é nem nunca foi feita por considerandos económica, histórica, ideológica e filosoficamente sustentados; quem a nega não o faz por ciência; fá-lo por medo. E quando a necessidade da sua efectivação se afigura minimamente provável, ou plausível, aos olhos de quem explora, como manda a necessidade natural de auto-defesa, nada lhes resta senão cerrar dentes e afiar garras. E é assim que, de tempos a tempos, lá vemos os Saraivas desta vida soltar aqui e ali indisfarçados laivos de incontrolável raiva, face àqueles que pretendem dominados e explorados para todo o sempre.
Quem a nega [a luta de classes] não o faz por ciência; fá-lo por medo.
E que não haja equívocos. É mesmo de “garras”, “dentes” e “raiva” que estamos a falar, sem nenhum exagero. O tom oscila entre o prepotente e extremado, se bem que podemos estar desde já todos certos de que vindo de onde vem – do lado de quem ainda vai tendo o poder – nunca tal será catalogado depreciativamente de “radical” ou “fanático”, nunca com a mesma facilidade com que se cataloga de “radicalismo” e “fanatismo” qualquer posição vinda dos sindicatos, deste ou daquele partido de esquerda, ou dos próprios trabalhadores. A verdade é que o patrão dos patrões, António Saraiva, dando um ar daquilo para que está e ao que vem foi mais taxativo que nunca: “Não contem connosco para as 35 horas no privado. Não contem connosco para os 25 dias de férias. Não contem connosco para complicar ainda mais a competitividade das empresas porque não é esse o combate que temos de fazer.” Não é a posição que constitui novidade; a novidade aqui é a palavra “combate”. É a trincheira cavada, a pedra na mão, o chicote feudal dos novos tempos, a mão que quanto mais bate mais sente necessidade de bater.
Leia-se bem a notícia, o seu texto e contexto. Os patrões não dizem, “ameaçam”. Os patrões não sugerem, eles “avisam”. É assim que se escancara a diferença e a fronteira do “nós” e “eles”. É o reconhecimento que fura as barreiras do politicamente correcto. É a sinceridade a furar a complacência dos diálogos surdos e das concertações trafulhas e inócuas. É assim que uma das partes assume taxativamente que cá está para derrotar, derrubar, subjugar, “combater” a outra parte, o adversário, o inimigo. É a bélica afirmação que tudo põe às claras. É a guerra. É a luta. De classes, pois claro.