Retomemos o assunto.
Porque é que um Estado quer regulamentar a prostituição?
Esta questão deve ser colocada em todos os países onde:
1 – A prostituição é encarada pelo Estado como profissão e por ele é regulada;
2 – A prostituição não é crime, apenas o lenocínio, e a sua regulamentação está em cima da mesa, como é o caso de Portugal.
Uma breve viagem pelos países que adoptaram vários modelos de regulamentação podem dar-nos as pistas, por exemplo, Áustria, Holanda, Nova Zelândia.
Na Áustria existem, registadas, 8000 pessoas prostituídas, apenas 2% são homens. 95% são estrangeiras, oriundas designadamente da Roménia, Hungria e Bulgária. Existem 800 bordéis licenciados.
Ao invés então do que se diz, quem está protegido por esta lei e o que fez a lei pelas mulheres e pelos registos e contribuições para a Segurança Social e impostos?
As mulheres eram obrigadas, numa primeira fase, a exames de saúde obrigatórios semanais. Hoje fazem esses exames mensalmente e são obrigadas a transportar consigo o registo de sanidade – devo mesmo relembrar o passaporte de saúde que Mussolini decidiu que todas as prostituídas deviam transportar e os exames de saúde vigentes em Portugal, em 1939, em pleno fascismo, quando a prostituição era regulamentada e as mulheres sujeitas a registo e a exames de saúde obrigatórios? Para protecção exclusiva, claro, do cliente-prostituidor.
No caso austríaco, para além das mulheres registadas que, como já vimos, são maioritariamente estrangeiras – e neste país é tão óbvio que não sei como é possível tentar sequer negar que há uma ligação mais do que óbvia com o tráfico – existem estimadamente 3000 a 4000 pessoas prostituídas ilegalmente e essas sim, maioritariamente de nacionalidade austríaca. Como razões para que não se registem voluntariamente indicam que não querem pagar impostos, querem anonimato e não querem submeter-se a exames de saúde. Então? Serve a quem?
Por sua vez, olhemos aos dados oficiais registados sobre tráfico de seres humanos: 73% dos casos são para fins de exploração sexual, no centro para pessoas traficadas estão 226 mulheres, 146 das quais provindas de bordéis. Nacionalidades? Precisamente. Roménia e Hungria.
Não é preciso muito para perceber a relação evidente entre tráfico e prostituição regulamentada.
A conclusão a que chegaram os economistas
Seo-Young Cho (German Institute for Economic Research-DIW Berlim), Axel Dreher (Heidelberg University, University of Goettingen, CESifo, IZA, KOF Swiss Economic Institute) e Eric Neumayer (London School of Economics and Political Science, UK) no estudo Does Legal Prostitution Increase Trafficking? (World Development Vol. 41, pp. 67–82, 2013), cruzando os dados de 150 países e analisando, nomeadamente, os países que regulamentaram a prostituição antes e depois da entrada em vigor de tais regimes é, precisamente, a de que a regulamentação fomentou e tornou mais difícil de penalizar o tráfico de seres humanos.
Voltando à alegada protecção social, das cerca de 125 a 150 mil prostituídas registadas na Holanda, apenas 5% estão inscritas na Segurança Social e a maioria não paga quaisquer impostos. (1) Os bordéis licenciados são propriedade de apenas 4 «empresários do sexo» – ou seja, proxenetas. Das cerca de 50 000 prostituídas nas janelas do Red Light District estima-se que mais de 75% sejam oriundas de países estrangeiros. (2)
E será sempre importante ler o que as mulheres nas janelas têm a dizer sobre a sua alegada protecção e a regulamentação que lhes foi imposta e cujas alterações no sentido de maior repressão sobre as prostituídas – registo e exames sanitários – estão presentemente a ser debatidas neste país.
E o que dizer do modelo que será o alfa e o ómega da protecção das mulheres nos dizeres da JS, da UMAR (e de parte do Bloco de Esquerda) e de parte das Capazes – o modelo da Nova Zelândia?
Antes de mais não me parece despiciendo referir que este é o modelo amplamente defendido por instituições como a UNAIDS, Amnistia Internacional e pela Open Society Foundations (3) do milionário George Soros (rings a bell?) e do grupo Global Network of Sex Work Projects (NSWP), cuja vice-presidente Alejandra Gil foi condenada no ano passado a 15 anos de prisão por… tráfico de pessoas para fins de exploração sexual.
Autoproclamadamente, o objectivo da Prostitution Reform Act, de 2003, na Nova Zelândia era o de “promover o bem-estar, a saúde ocupacional e a segurança dos profissionais do sexo”. Não obstante, a avaliação da lei feita em 2008 veio provar que nada disso aconteceu. Um inquérito a prostituídas em bordéis licenciados determinou que, apenas nos 12 meses anteriores, 38% “sentiram que tinham que aceitar um cliente quando não queriam”. Nesse inquérito, 5% das prostituídas de rua e 3% das prostituídas em bordéis tinham sido violadas por um cliente-prostituidor. A conclusão dos avaliadores? «Os bordéis que tratavam os seus trabalhadores de forma justa antes da promulgação do PRA continuaram a fazê-lo e os que tinham práticas de gestão desleais continuaram com estas”.
Acresce que que as mulheres prostituídas que não cumprirem escrupulosamente a lei (PRA) ao não adoptarem “práticas sexuais mais seguras”, pagam multa (até NZ $ 2.000). De acordo com o Relatório de Avaliação (4), este regime pode mesmo trazer “consequências financeiras sérias” para as prostituídas. A fim de não serem multadas, colectam-se como trabalhadoras independentes, ficando a seu cargo o pagamento de impostos e segurança social, sendo certo que enquanto trabalhadoras independentes não lhes são garantidos direitos sociais como o subsídio de doença nem tão pouco o direito de a agir judicialmente contra os clientes-prostituidores, por ser uma actividade legalizada. O que tem levado ao aumento significativo da chamada prostituição não legalizada ou ilegal.
E este é o modelo de regulamentação preferido – o que penaliza as mulheres, multando-as, obrigando-as a ter a seu cargo todos os custos com segurança social e impostos enquanto os proxenetas agem livremente e lucram com a exploração sexual de pessoas. Afinal, quem ganha?
A falência da alegada protecção social e dos direitos «laborais» das prostituídas nos países em que a regulamentação da prostituição foi adoptada está mais do que documentada e provada. Basta então seguir o dinheiro que continua sempre nas mesmas mãos: proxenetas e Estado. Como já referi aqui: «o proxenetismo passa a ser uma actividade comercial, igual a tantas outras, com o seu contributo para os PIB de vários países. 5% do produto interno bruto da Holanda, 4,5% na Coreia do Sul, 3% no Japão e, em 1998, a prostituição representava de 2% a 14% do total das atividades económicas da Indonésia, Malásia, Filipinas e Tailândia.»