Marcelo: O candidato deles

Nacional

O custo das campanhas das presidenciais e a forma como Marcelo Rebelo de Sousa foi louvado pelos media já foi aqui abordado, e tão bem, pelo António. Não é sobre isso que me apetece escrever, embora isto ande tudo ligado. No dia 3 de Janeiro de 2016, o Público decidiu vender um folheto de campanha do candidato que é tão independente do PSD/CDS como eu sou vegetariano.

Esta capa deve fazer-nos pensar, tem de fazer-nos pensar no papel dos media tradicionais na formação de opinião. E Marcelo é um especialista nisso, tendo em conta que andou anos e anos, durante 52 domingos por cada um, a explicar-nos como devemos pensar em relação a tudo e mais alguma coisa, desde o futebol, passando pelo atletismo, política internacional, nacional, culinária, geopolítica, rendas de Bilros e tudo o mais.

Nas suas Conversas em Família, Marcello, perdão, Marcelo, pôde dizer tudo, ensinar-nos tudo, com o alto patrocínio da TVI. Voltando ao dia 3 de Janeiro e ao Público, convém recordar desde já que é propriedade da família Azevedo. Do Belmiro e do Paulo. Na sua criação e história, o Público sempre foi tido como um diário mais inclinado para a esquerda, uma esquerda urbana e intelectual, com estudos. Foi essencialmente a secção cultural que, durante muitos anos, fez o Público crescer entre este segmento da população.

O equívoco começa aqui. Um diário de esquerda criado por um capitalista é coisa que não existe. O primeiro número do Público, para quem se recorda, tinha como foto da primeira página Álvaro Cunhal de costas, com uma manchete que anunciava o fim do PCP e da sua linha ideológica. E fica claro para que “esquerda” é que o Público foi criado, pensado e mantido durante tantos anos, mesmo com todos os prejuízos que sempre teve.

A verdade é que o poder da imprensa escrita já não é o que era. Logo no dia 3 de Janeiro, nas redes sociais, foram inúmeras as publicações a condenar o Público e a questionar se fará o mesmo com todos os outros candidatos. É pouco, é certo. Há uma parte substancial da população que não usa redes sociais e continua a comer tudo o que é debitado pelos media. Mas começa a haver uma mudança que os media tradicionais parecem não acompanhar ou não perceber. A Internet permite um escrutínio e difusão muito mais abrangente do que sucedia há uns anos, quando o Correio da Manhã tomava o partido da direita e apelava ao voto na AD. De forma tosca, mas apelava. E, honra lhe seja feita, sem grande dissimulação.

É evidente que há uma promiscuidade entre jornais, jornalistas e política. No anterior governo do PSD/CDS, foram pelo menos dez os jornalistas do Diário de Notícias que assumiram funções em cargos de nomeação, desde directores de serviço até assessores. Isso mesmo: dez jornalistas que um jornal que se aguenta nas bancas sabe-se lá como, perdeu para um governo. Carla Aguiar, Eva Cabral, Francisco Almeida Leite, João Baptista, Licínio Lima, Luís Naves, Maria de Lurdes Vale, Paula Cordeiro, Pedro Correia e Rudolfo Rebelo. O DN há-de ser um caso de estudo sobre a sua verdadeira utilidade, sendo um jornal de âmbito nacional que vendia, em 2014, pouco mais de 15.000 exemplares por dia, contadas também as assinaturas digitais. Isto talvez ajude a perceber a simpatia mediática que Marcelo, o candidato da direita, goza nos jornais, rádios e tv.

Marcelo é o candidato deles. Da direita, do populismo dos orçamentos para as campanhas, mesmo depois de ter apoiado Cavaco, quando este gastou 1.800.000 euros na sua campanha. Nesta altura, Marcelo andava pouco preocupado com os gastos. É o candidato dos donos dos media e dos seus amigos do BES, por onde também passou Maria de Belém, que a Ordem dos Médicos, com um sentido de oportunidade muito apurado, homenageará no dia 12.

Nenhuma destas questões é nova e a promoção do candidato do PSD/CDS repetir-se-á até ao dia das eleições. De forma mais ou menos clara, Marcelo será levado ao colo até ao trono de Belém. Cabe a nós desmascarar o papel que sempre teve no apoio à direita, às várias direitas que foram comandando o país através de esquemas de promoção semelhantes.