Os esquecidos de Donbass

Internacional

Em 2018, estive em Donetsk e Lugansk. Visitei orfanatos, hospitais, escolas e fábricas. Falei com mineiros, autarcas, reformados, crianças, professores, empresários e sindicalistas. Assisti às lágrimas de mulheres enlutadas e ouvi disparos de artilharia sobre zonas civis.

Choca-me que nunca ninguém tenha querido saber desta gente, desde jornalistas a governos, e de repente tenham descoberto que há um Acordo de Minsk porque a Rússia deixou de o reconhecer, quando a Ucrânia o violava diariamente desde o momento em que foi assinado. Esse acordo previa, no ponto 3, a descentralização administrativa da Ucrânia com um regime de governação local em Donetsk e Lugansk.

Nas negociações, estiveram um ex-presidente da Ucrânia, um embaixador russo e os presidentes de Donetsk e Lugansk. Em 2018, três meses depois de ter visitado Donetsk, as forças especiais ucranianas meteram uma bomba escondida no Café Separ, que foi activada à distância quando entrava o presidente Alexander Zakharchenko. A Ucrânia assassinou, assim, um dos representantes da mesa de negociações A solução partia por resolver tudo aquilo que levou ao conflito. A democratização da Ucrânia com combate às forças fascistas, o fim da xenofobia estatal contra as comunidades russófonas, a descentralização administrativa e o fim da proibição dos comunistas e outras forças.

A intervenção da Rússia a pedido dos governos de Lugansk e Donetsk é uma consequência óbvia de quase uma década de violação dos Acordos de Minsk e a Ucrânia nada fez para evitar este desfecho, tal como os Estados Unidos ou a União Europeia. Putin recusou várias vezes reconhecer as Repúblicas Populares de Donetsk e Lugansk por entender que essa decisão violava os Acordos de Minsk. A pressão militar sobre a linha de contacto e a ameaça de entrada da Ucrânia na NATO fez o resto. Ninguém devia estar feliz com este desfecho.

3 Comments

  • Maria Armanda Serra

    26 Fevereiro, 2022 às

    Bruno Carvalho estou também de acordo com o que disse. Ainda hoje falei por Telegram com uma amiga russa que vive lá e ela gosta e apoia o seu presidente. Disse-me que estão fartos daz perseguicoes de que são vítimas os russos qlue viva na Ucrânia.

  • Jorge Nunes

    24 Fevereiro, 2022 às

    Muito bom o teu texto, Bruno. És único que está escrever bem sobre este conflito e não embarca na propaganda e em disparates, como o Diogo Martins do blog Ladrões de Bicicletas.
    Chamar a isto de expansionismo russo e meter uma gravura de um inglês e outro francês do século XVIII a dividir o Mundo entre si, é qualquer coisa de patético ou mesmo infantil.

  • antónio pereira

    23 Fevereiro, 2022 às

    Completamente de acordo. Durante 7 anos nenhuma potência ocidental ligou nada aos acordos de Minsk. A Ucrânia disse claramente que não os ia cumprir, preto no branco. Putin insistia neles e insistia e insistia. Ninguém ligava, ninguém pressionava a Ucrânia para implementar aquilo que tinha assinado. Agora Putin reconhece as duas repúblicas e os que se calaram durante sete anos dizem agora: e os acordos de Minsk? Agora é tarde. Limpem as mãos à parede.

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