Senão o quê?

Internacional

Não está tempo para sermos ingénuos: o governo grego traiu o seu povo e mostrou cabalmente que os únicos referendos vinculativos que o Syriza reconhece votam-se nas reuniões do Eurogrupo.

Pouco interessa quais eram as intenções de Tsipras ou dos seus seguidores. Não se trata de escamotear as pressões, ingerências e chantagens de que foi alvo o governo e o povo helénicos, mas de enfrentar a realidade como ela é: este governo assumiu promessas que não cumpriu, convocou um referendo que não respeitou e acaba de assinar o maior retrocesso social das últimas décadas.

O governo de Tsipras aumenta a idade da reforma, sobe brutalmente os impostos para os trabalhadores, injecta o erário público nos bancos privados e transforma a Grécia, com a hipoteca de 50 mil milhões em activos, num protectorado de Bruxelas. Não criticar o governo que assina estas medidas anti-populares, sob qualquer pretexto, é toda uma declaração de intenções do que se quer para Portugal e para a Europa.

Sim, é verdade que houve quem não se tivesse deixado enganar pelo cavalo de Tróia: uns tentaram cavalgá-lo mas houve outros que se abstiveram de festejos. E desengane-se quem atribua a desconfiança a qualquer sectarismo: Tsipras não capitulou por ser um líder fraco, os seus negociadores não atiraram a toalha ao chão por não saberem negociar nem o Syriza traiu pela grandeza das forças que contra ele se investiram.

Tsipras traiu porque, reconhecidamente, não vê qualquer caminho fora do Euro e da União Europeia. E, como em qualquer negociação em que se enfrentam interesses antagónicos, há que antecipar a pergunta que, mais tarde ou mais cedo, o outro lado há-de fazer: «senão o quê?».

Isto serve tanto para uma reivindicação laboral («se não cedem fazemos greve!»), como para uma guerra («se não cedem atacamos»), como para as negociações com os credores da dívida. O problema é que Atenas foi pedir a Bruxelas o que Bruxelas não quer nem precisa de dar. E, quando Bruxelas perguntou «Se não o quê?», o Syriza respondeu: «senão nada».