Mais uma vez um sentimento de absoluta perplexidade assomou-me com um novo tweet da Fernanda Câncio. Eu ainda me espanto (e espantar-me-ei sempre) quando pessoas inteligentes escrevem coisas assim.
Câncio pergunta pelo racional de impedir os despejos a quem não paga a renda. E eu pergunto como é que alguém pode não entender – imediatamente – a razão de ser das propostas aprovadas, das propostas em discussão, incluindo a moratória que não só é absolutamente insuficiente como apenas vigora por um ano, mas, ainda assim, é já responsável por muitas famílias poderem ficar na casa onde sempre viveram e impedir o aumento colossal das rendas.
De facto, a Lei Cristas permitiu que rendas de 20, 30, 60 euros disparassem para 200, 300, 500, 800 e por aí fora. Para agregados que recebem 600/700 euros por mês, se não menos ainda – primeiro ponto do racional.
Numa primeira fase, quem não consegui pagar submeteu-se a quartos, a autênticos buracos por serem os únicos sítios onde ainda tinham algum dinheiro para pagar um tecto, mas não o dinheiro suficiente para viver com dignidade.
Um dia dei nota dos muitos casos com que me deparei, mas aparentemente no mundo onde Fernanda Câncio vive, não existem. O que é normal, diria. Fi-lo na consciência absoluta do meu privilégio e na convicção profunda de que é emergente e urgente a defesa do direito à habitação, que é um direito fundamental e seguramente, em confronto com o sacrossanto direito de propriedade, «ganha». Muito mais quando em confronto com a especulação que mais do que tudo devia ser criminalizada quando feita à custa da hipoteca desses direitos fundamentais.
E é por ter consciência do meu privilégio, que antes de mais é um direito, que defendo intransigentemente que todos devem ter acesso a uma habitação digna, tal como prevê a Constituição: contra bancos, municípios, privados que fazem de um artigo constitucional uma conta bancária com dezenas de zeros enquanto o mercado dita a subida indecente das rendas negando as condições mais básicas a milhares de pessoas. – segundo ponto do racional.
Situações de desemprego, de pobreza, de inexistência de rendimentos para pagar a renda, de disponibilidade de rendimentos mínima após o pagamento da renda que nem garante o direito à subsistência,… – terceiro ponto do racional.
Racional que se constrói no dia a dia e no contacto com a realidade. No âmbito do encaminhamento jurídico gratuito em Arroios, a freguesia onde vivo, 90% das pessoas têm problemas habitacionais. Além dos relatos do texto anterior, muitos outros se lhes seguiram: uma senhora de 60 anos que vive num apartamento, na subcave, sem electricidade (cedida pelos vizinhos), com baratas e ratos; um casal que vive num quarto indicado pela Santa Casa da Misericórdia, pagam 250 euros e coabitam com ratos; um homem com insuficiência cardíaca, com 63 anos, que vive num quarto onde paga 240 euros, num apartamento com mais 8 pessoas, onde o senhorio cobra o que quer, quando quer, com acesso a uma única casa de banho sempre entupida, apenas com uma chapa para cozinhar e cuja irmã, porque vão subir a renda do quarto dela de 250 para 400 euros, será despejada; um apartamento onde vivem 6 imigrantes que pagam, cada um, 400 euros e, como não entendem bem a língua, não sabem que direitos têm e entretanto ficaram sem electrodomésticos e com a casa fechada e fechadura mudada; uma mulher de 64 anos a quem vão subir a renda de 500 (!!!) para 850 euros e ficará sem sítio para morar em 30 dias, várias famílias a quem sobem a renda para o triplo e dão o aviso prévio de dois meses.
E o que pergunto é isto: como é que alguém compara o direito à habitação com o ir a um restaurante e sair sem pagar? Foi a isto que se reduziu o humanismo e o racional? Como é possível não entender que estas pessoas têm tanto direito como eu, como a Fernanda Câncio, a viver sem ratos, a viver com electricidade, a não ser despejadas porque a selvática lei das rendas e a especulação imobiliária mataram o direito à habitação?
De facto, não cesso de me espantar.
12 Setembro, 2018 às
Pobre José… Já é um consolo saber que nem te deitaste cedo, para vir aqui responder ao meu comentário.
É tão obcecado, o menino José…
10 Setembro, 2018 às
O José esqueceu-se que a maioria dos senhorios é gananciosa. Também se esqueceu da entrevista dada pelo presidente da associação dos proprietários que dizia o seguinte: «Quem hoje quer viver numa casa, tem de a comprar» Também disse esta pequena vergonha: «O arrendamento é uma situação de empréstimo». O José esqueceu-se de outra entrevista dada por Freitas do Amaral, na altura em que a lei de Assunção Cristas foi promulgada (com ajuda do presidente Cavaco Silva), onde disse o seguinte: «Esta lei beneficia em excesso os senhorios».
Tudo isto e as ganâncias acumuladas pelos senhorios (que não fazem obras), pelas agências imobiliárias e pelos consultores imobiliários, fazem do José um pobre e infeliz desentendido.
Quanto às novas regras de mercado, a minha pergunta é esta: Voltaremos ao tempo das barracas, tal como existiu antes de Abril de 1974?
Será que ainda vamos ver alguém a construir um muro na cidade, para separar os habitantes pobres dos ricos, tal como existe em Lima, no Perú?
Na verdade, os chamados «Treteiros» são as pessoas, como o José (o pobre José) que não se informam e que aceitam sempre tudo aquilo que o sistema impõe.
11 Setembro, 2018 às
Infelizmente, a maioria dos senhorios prova que o teu argumento – tão a favor desta classe – está errado. A grande maioria não contacta com os inquilinos e nem faz reparos às casas, onde habitam os teus inimigos (esses malvados dos inquilinos).
Aqueles que tu chamas de «esquerdalhos» (tal menino embirrento que és) ainda tentam modificar as leis, para que a sociedade não caia em declínio.
Na verdade, uma sociedade sã e em evolução, faz-se com uma lei de habitação justa, onde haja casas habitadas por gente (e não devolutas), com preços e rendas acessíveis. A casa fez-se para viver e é a base de uma vida.
Na realidade, o teu pensamento (se existe) é uma cópia daquilo que é dito, vezes sem conta, por andróides como Luís Menezes Leitão, ou os deputados Leitão Amaro e João Almeida (salvo erro, um deles faz parte da tua cor política).
5 Setembro, 2018 às
Tem o José Sócrates.
5 Setembro, 2018 às
Ela que explique o seu racional, dela própria, se é contra a existência dos sem-abrigo?
5 Setembro, 2018 às
Inteligente? Não!no mínimo será esperta
Qualquer ser humano tem direito à habitação
Não poderá é exigir um condomínio fechado em França! Só se tiver um bom amigo.
4 Setembro, 2018 às
Mas será Fernanda Câncio inteligente? O próprio «tweet» que escreveu é digno de uma mulher fraca e cobarde.