A mulher mais bonita é a que acredita mesmo (e di-lo com tanta força que não podia estar a mentir) que um mundo melhor é possível. As mulheres de esquerda são mais bonitas porque são mais humanas e conseguem sentir como suas as dores de parto da humanidade sofrida. As mulheres de esquerda sentem mais fundo, indignam-se mais vezes, gritam mais alto e desejam com mais força. As mulheres de esquerda cheiram a pólvora, beijam sabendo que só temos estes anos e entregam-se mais porque a não ser as proverbiais correntes, não têm nada a perder. As mulheres à esquerda são mais perigosas: não respondem aos aborrecidos ditames da conveniência conjugal nem à opressora liturgia do lar, lêem bons livros e vêem bons filmes de que nunca ouviste falar. Não são subalternas de nada, vão à luta, lideram os homens e riem-se do cumprimento de contractos. Gabriel García Márquez dizia que o amor tem mais quartos do que uma casa de putas. O coração das mulheres de esquerda não é um T0, onde só cabes tu e depois se fecha ao mundo como um ouriço-cacheiro. As mulheres de esquerda conseguem amar a humanidade inteira. O coração da mulher de esquerda é maior que o hotel Marriott e tem mais capacidade que o parque de campismo exterior da Festa do «Avante!».
As mulheres de esquerda não são senhoras nem usam casacos de peles: são edifícios elegantes que quando falam te ensinam coisas. São mais femininas que a ilusão do espelho e que a estética senil das revistas de moda: vestem uma t-shirt e uns calções e vão construir a festa, para se sujarem se for preciso. Voltam tisnadas de óleo e sujas de terra e ainda mais bonitas. As mulheres de esquerda são femininas porque o são. Mas de uma feminilidade diferente, da sua própria lavra.
As mulheres de esquerda são mais bonitas porque compreendem que também a beleza obedece às leis dialéticas que regem a história do mundo. A beleza feminina é dialética pura, embora alguns homens só se apercebam disso durante momentos fugazes. Os olhos das mulheres de esquerda são como os da Blimunda Sete-Luas e vêem sempre o que os homens são no fundo. E às vezes, o cabelo das mulheres de esquerda é como o dia está a ser.
As mulheres de esquerda são bonitas quando estão cansadas, porque trabalharam oito horas. São bonitas quando estão tristes, porque estão desempregadas. São bonitas quando, como dizia a Maria Velho da Costa, acordam pela manhã as bestas, os homens e as crianças adormecidas. E, sobretudo, as mulheres de esquerda amam melhor, porque sabem que o amor verdadeiro é só uma espécie invulgar de camaradagem.
15 Julho, 2019 às
Adorei o texto em si, principalmente toda a profundidade dada a ele respectivamente a respeito do sentido da verdadeira beleza, a intelectual humanista, toda ela fluindo do glorioso ideal comunista. Parabéns
11 Setembro, 2017 às
Depois de tanto comentário e da tentativa vã de desvirtualização de um texto tão bonito quando o que ele diz na sua essência é que a questão estética na caracterização da beleza da mulher é tão de menos importância, está tudo dito logo no início: "A mulher mais bonita é a que acredita mesmo (e di-lo com tanta força que não podia estar a mentir) que um mundo melhor é possível. Porque os ideais embelezam os corpos,(…)
Lindo texto, sobre ele comecei a manhã a ouvir o seguinte "Amor és tu", isto vindo de um homem que sabe que adoro um salto alto, um bâton vermelho e uma lingerie de tirar a respiração. Mas que me vê desalinhada, despenteada de t-shirt e calças de ganga enquanto pinto faixas e mesmo assim me diz que sou bonita.
Bonito mesmo é o sorriso que a luta nos trás, seja em que condição for, em que situação for, o sorriso da tal confiança num mundo melhor.
31 Julho, 2017 às
É um texto muito interessante, que mostra que a questão estética é o de menos. Que a beleza não é só a exterior. Esse "mais bonita", tem amplos sentidos que suplantam a questão restritiva da plástica, para perscutar as questões da boniteza da alma.
8 Julho, 2014 às
Mui fofo isto. Os homens de esquerda me enlouquecem (de prazer… sexual, intelectual, emocional!). Homens de esquerda são intensos, quentes, generosos, da família sem serem de família, caseiros sem serem da caserna, barbudos, cabeludos e perfumados. Sabem cozinhar e massagear os pés cansados da luta. Sabem receber amor, sabem dar amor. Sabem o que é Amor.
3 Março, 2014 às
🙂 que texto tão bonito… palavras que fazem falta.
C. G.
27 Fevereiro, 2014 às
Texto fascinante!! Bela descrição das guerreiras de esquerda
Parabéns
Sara Marques Costa
24 Fevereiro, 2014 às
socialista o caralho. a mulher sexy revolucionária tem as unhas vermelhas e é anarquista.
23 Fevereiro, 2014 às
António, a hipérbole (da vanguarda da reacção como da beleza da revolucionária) é sempre um exagero.
Quanto às prrguntas – Nestes termos, sim. Sim, mesmo nas lideranças. Quando sensualizo, objectivo. Quando verbalizo, reforço. Não te esqueças que ha um texto e um contexto e as questões de género têm uma história de milhares de anos. Um materialista dialéctico deveria ter esta lição.
Ainda bem que não era para mim. Fico mais tranquila. Mais logo passa cá por casa para me fazeres um minete.
22 Fevereiro, 2014 às
ó Andreia Cunha, obrigado pela crítica, a sério. Tentei compreendê-la e revejo-me nalguns aspectos. Mas não acha que está a exagerar um bocadinho quando diz que eu sou a vanguarda da reacção porque chamo bonitas às mulheres revolucionárias?
Chamar bonita a uma mulher é sexista? Mesmo quando escrevo que lideram os homens e não são subalternas de nada? E achar uma mulher atraente é torná-la no "objecto" de alguma coisa?
Mas por favor não se sinta tão incomodada, Andreia. Posso assegurá-la de que absolutamente nenhuma parte do meu texto lhe era dedicada.
21 Fevereiro, 2014 às
"Essa revolução não é a minha", "ditas burguesas", "Eu própria", "categoria de género" "agenciamento político": estamos conversados.
Beijinhos muito grande para a Andreia (ela própria) e para os seus amigos da sua revolução,
DV
21 Fevereiro, 2014 às
Eu cá não quero participar numa luta em que uma parte importante da minha identificação política – o meu género – seja visto nos termos deste post e de grandes partes deste comentários. Essa revolução não é a minha. Se é para ler "mulher" como "proletariado", então teriam escrito o texto com "proletariado" e não "mulher". Este texto torna as mulheres objectos de embelezamento e fá-lo com bastante superficialidade e preconceito (como já foi dito nos comentários) – tanto as revolucionárias como as ditas burguesas. Eu própria não sou grande adepta da categoria de género como primordial no agenciamento político. Outra coisa é aceitar que uma mulher, qualquer mulher, possa ser tratada nos moldes sexistas deste texto. Tratar do embelezamento é tratar da subalternidade no movimento revolucionário. Não estou para isso. Entendo, até, que a poética da beleza para a subalternidade bacoca, é coisa da reacção e o António Santos é a sua vanguarda.
19 Fevereiro, 2014 às
O texto n tem nada de sexista. O problema é outro e bem mais grave: a estitização da exploração. Não, as mulheres (e os homens) da burguesia, as que não lutam pelo pão (o seu e dos outros), tem mais condições para serem mais bonitas (com as profundidades todas de que o texto fala e mais algumas).
Pois elas tem o tempo e o dinheiro que roubam para isso, e o isso não é essencialmente as unhas pintadas ou o rimel, é o corpo nutrido, o sol de todas as horas, as noites bem dormidas, a ausência de preocupações que nos vão deformando a cara e o corpo, as viagens pelo mundo, o tempo para ler mais e para estudar, o tempo e dinheiro para ir a museus, etc etc etc
Dizer o contrario é negar uma consequência da própria exploração, é desarmar os trabalhadores e tornar inútil a própria luta por uma outra sociedade onde aí sim os produtores serão sem dúvida os mais belos.
DV
18 Fevereiro, 2014 às
Grande texto. Gostei muito.
Obrigada.
18 Fevereiro, 2014 às
João, infelizmente não creio que no limite da individualidade ninguém objectifique (se é que este verbo existe) as mulheres. Muitas mulheres objectificam-se a si mesmas, as batalhas individuais para corresponder a um estereótipo físico e de comportamento é disso o exemplo mais massificado e assustador (e não estou a dizer com isto que procurar ser mais agradável para si mesma/mesmo e para os outros seja uma auto-objectificação). Estou de acordo contigo quando dizes que as mulheres têm estado presas nas amarras da beleza. Mas essas amarras de beleza são físicas e são estereótipos. Não é disso que fala o António, fala de uma beleza das ideias e da manifestação dessas ideias em tudo que uma mulher (e eu acrescento, um homem) pode ser, até na sua sexualidade.
18 Fevereiro, 2014 às
De qualquer forma toda a mulher transporta em si sempre algum traço de beleza.
Mas quando é guerrilheira, a beleza associada à coragem supera tudo de extraordinário que qualquer mulher possa ter.
A Tanja Nijmeijer é o expoente máximo dessa realidade.
http://www.youtube.com/watch?v=kQT0yUUgdaM
http://www.youtube.com/watch?v=PU0Jy6-j04s
Carlos Carapeto
18 Fevereiro, 2014 às
João então para ti sempre que se elogia a beleza de uma mulher, estamos a oprimi-la com "as amarras da beleza feminina"?!?!?
desculpa, mas reclamar contra o elogio da beleza não é feminista é parvo.
Rita Lopes
18 Fevereiro, 2014 às
Irene, as mulheres são pressionadas todos os dias e a toda a hora pelas questões da beleza. E o "eu não as considero objetos" é meramente uma análise individual. No limite, na individualidade, ninguém as objetifica. No coletivo, é muito mais do que isto, ou estou enganado? E julgo que é disso que falamos aqui neste sexismo do texto – de um coletivo extremamente oprimido, também nas amarras da beleza feminina.
18 Fevereiro, 2014 às
Pois é José, também há os que acham as bonecas de borracha mais sexys, há os procuram parceiros e parceiras que se pareçam com as pessoas de papel nas revistas "photoshopadas", há quem se sinta mais atraído pelo cheiro das carteiras e pelo erotismo do poder, também há quem se excite com o carrasco e adore o desprezo, há os que fazem amor com o espelho, há os que veneram a animalidade, esquecendo que da nossa natureza faz parte a memória e a capacidade de julgar e há os arrogantes frustrados incapazes de encontrar beleza seja no que for.
17 Fevereiro, 2014 às
Um texto muito bonito. Como mulher e comunista senti-me elogiada e como a irene sá não compreendo a acusação de sexismo. Não compreendi a t-shirt e os calções.
17 Fevereiro, 2014 às
a verdadeira beleza da mulher não é tão física
as dores de parto da humanidade sofrida
a áspera mão…
A esquerda é tão sexy…
17 Fevereiro, 2014 às
Muito bem, Irene! Há esquerdistas que quando se fala em mulheres bonitas têm logo comichão no feminismo.
17 Fevereiro, 2014 às
Chapeau Irene
De
17 Fevereiro, 2014 às
Que raio de preconceito têm algumas mulheres que acham que as estão a diminuir quando alguém se fala de beleza feminina! Achar que as mulheres revolucionárias são mais bonitas não as torna um objecto de embelezamento da revolução, nem o António refere que ser bonitas é o seu papel no mundo. Também Lénine disse que o comunismo é a juventude do mundo, no entanto os comunistas não são apenas os portadores da jovialidade. Eu também acho os homens e as mulheres revolucionárias mais bonitas e não as considero objectos. O juízo estético é sempre ideológico e a atracção também. Quanto à poesia, deixo aqui as palavras de Vinicius n'O operário em construção. Expressam o que o António diz de uma outra forma. Desafio a que encontrem aí algum vestígio de sexismo:
"Naquela casa vazia
Que ele mesmo levantara
Um mundo novo nascia
De que sequer suspeitava.
O operário emocionado
Olhou sua própria mão
Sua rude mão de operário
De operário em construção
E olhando bem para ela
Teve um segundo a impressão
De que não havia no mundo
Coisa que fosse mais bela."
17 Fevereiro, 2014 às
Só para clarificar: eu não me manifesto contra as unhas vermelhas nem saltos altos… não sei onde foram buscar essa ideia. Digo apenas que outras coisas são às vezes mais bonitas.
Mas obrigado pelas críticas, são úteis todas elas.
17 Fevereiro, 2014 às
eu não sou um objecto de embelezamento na tua (porque assim é mesmo só tua) revolução, ou como disse outra companheira de lutas, ó antónio, vai fazer odes ao teu tio
17 Fevereiro, 2014 às
A minha mulher é revolucionária, mas gosta de maquilhagem, saltos altos e de uma boa roupa interior, será que é menos revolucionária por isso?!
17 Fevereiro, 2014 às
eu diria que não dá para separar em parte alguma. parece-me sexista no seu todo. muito, aliás.
17 Fevereiro, 2014 às
ó andreia, que parte do texto é sexista?
17 Fevereiro, 2014 às
Está provado que o sexismo pode ser poético
16 Fevereiro, 2014 às
Caro anónimo, são gostos. No entanto, recomendo-lhe o novo clip da miley cyrus.
16 Fevereiro, 2014 às
Foda-se… A descrição que fazes das mulheres de esquerda é tão sexy como um tanque da roupa com merda até às orelhas.
15 Fevereiro, 2014 às
Brrrrrrrrrrrrrrr………..
15 Fevereiro, 2014 às
🙂
A. Silva
15 Fevereiro, 2014 às
José, esse é um comentário tão básico que passa facilmente por anedota. Um texto que nos diz que a verdadeira beleza da mulher não é tão física mas uma mulher culta, interessante com ideais e profundidades tem muito maior magnetismo e atração que uma mulher maquilhada e arranjada mas completamente superficial, só o José para comparar esta crítica ao ideal de beleza da mulher vigente na atual sociedade capitalista e fazer uma comparação com uma qualquer religião.
Francisco Canelas
15 Fevereiro, 2014 às
Tinha que vir a cassete bafienta da "religião"…
15 Fevereiro, 2014 às
Tão certo quanto uma religião qualquer!
15 Fevereiro, 2014 às
Tem "momentos" muito bonitos!
Vai-se a ver… é um texto de esquerda… 🙂
15 Fevereiro, 2014 às
"As mulheres revolucionárias são bonitas quando estão cansadas, porque trabalharam oito horas" – …tivesse a burguesia tal preconceito legalista relativamente ao horário de trabalho.