Há cem anos, a subserviência a uma potência externa (no caso, a Inglaterra) atirou-nos para a frente de combate da maior das guerras até então travadas no tabuleiro europeu e mundial. Um século decorrido, o mesmo sentimento de bajulação e servilismo de quem nos governa face a uma outra grande potência externa (neste caso, a Alemanha), atira-nos em sacrifício, rotos e famintos, para as trincheiras da batalha pela defesa da ideologia da austeridade. Num caso como noutro partimos impreparados, com uma mão à frente outra atrás, sem vontade de exigir o que quer que fosse ou o que quer que seja, mas em ambos os contextos com a mesma predisposição e o mesmo objectivo: ser um cão-de-fila exemplar, elogiado “pela dona” enquanto serventuário fiel, bem domesticado e obediente.
Em boa verdade, a imagem que Portugal tem hoje na Europa e no mundo não é a de um país “cumpridor” e “responsável”, nem a de “um caso de sucesso” das políticas europeias; a imagem de Portugal é hoje apenas a de um mero e rastejante lambe-botas da Alemanha.
Na vergonhosa e humilhante qualidade de voz do dono, este país vergado ao vexame do domínio financeiro alemão na União Europeia esteve ontem na reunião do Eurogrupo com uma única missão: defender a todo o custo as posições de Berlim. Maria Luís Albuquerque, a senhora dos «swaps», tratou de tudo fazer para que a austeridade não tivesse qualquer tipo de atenuante ou interrupção na congénere Grécia, ao ponto de o ministro das finanças grego que, contrariamente a ela, foi eleito e não nomeado (e mesmo assim contra a vontade de Portas, o irrevogável), tivesse que vir a público dizer que «por uma questão de boas maneiras» não iria comentar as notícias que davam conta do «bloqueio ibérico» ao acordo firmado.
A atitude indigna e repudiante de Portugal por certo não mereceu nem merecerá, da parte da diplomacia grega, qualquer posição que se mostre à altura da lamentável façanha. O Syriza parece ter optado por uma estratégia de cooperação com a corda que tem esganado o seu país, necessitando de continuar a tratar a UE e seus membros como “parceiros”, e acreditando que com cedências alcançará forma de cumprir o pacto que estabeleceu com o povo que o elegeu. Não cabe aqui, por enquanto, dizer se sim ou não o Syriza será capaz de responder aos anseios e à vontade do povo grego. Mas cabe certamente sublinhar que não fosse a imperatividade do acordo nos termos em que foi assinado e Portugal teria da Grécia, como seria normal, a mais firme e retumbante resposta que faria com que a vergonha internacional fosse ainda maior.
É esta a “boa imagem externa” que PSD e CDS tanto almejavam. É este o “prestígio” e a “confiança das instituições europeias” que norteava o discurso justificativo do governo. Hoje a realidade da venialidade portuguesa face à Alemanha salta à tona de forma mais evidente, de forma ainda mais vexatória. Em boa verdade, a imagem que Portugal tem hoje na Europa e no mundo não é a de um país “cumpridor” e “responsável”, nem a de “um caso de sucesso” das políticas europeias; a imagem de Portugal é hoje apenas a de um mero e rastejante lambe-botas da Alemanha. Um rebaixado e amesquinhado país sempre em volta das saias da sua senhora, pacientemente à espera que caiam algumas migalhas do seu rico e farto regaço.