A culpa é do sistema

Internacional

Sérvia, Europa, Janeiro de 2017

Os agradecimentos aos construtores da União Europeia sucedem-se, nos últimos dias. Afinal, como não agradecer a quem nos atirou dinheiro a troco daquilo que, achávamos nós, era nada? Há melhor incentivo? Claro que não havia outro caminho, nunca há outro caminho. É aquele discurso das inevitabilidades que tão bem conhecemos. Ficámos com estradas que levam a lugar nenhum, porque recebemos dinheiro para modernizar as infraestruturas do país, mas ficámos sem ter o que transportar, porque também recebemos para não produzir, recebendo de fora o que produzíamos, mas não importa. Enquanto houvesse obras públicas, havia de haver emprego. Obra feita, pois claro. Nem pescas, nem agricultura, nem indústria, mas os gigantes da Europa fizeram o favor de nos dar dinheiro. Que agora pagamos com todos os juros, financeira e economicamente.

Ao que parece, para alguns sectores, não fosse a nossa entrada na UE e estaríamos todos desumanizados, uma Albânia ou uma Cuba atravancada no cu da Europa, entre Espanha e o Atlântico. Assim, felizmente, estamos no mundo desenvolvido. Temos tudo e, ao mesmo tempo, temos nada, porque o que temos é, na verdade, propriedade de quem nunca vimos e não passa de uma série de zeros e uns que circulam entre redes. Comércio livre! Temos é pouco para vender, a menos que comecemos a cortar os dedos.

Mas isso não importa, porque temos liberdade, que isto não é Cuba nem Albânia. A menos que seja em Espanha, por exemplo, onde se pedem dois anos e meio de prisão para uma jovem que escreveu, no Twitter, sobre o fascista Carrero Blanco. Ou na Hungria. Ou na Ucrânia. Ou na Polónia. Temos paz no continente e isso é relevante. Menos quando os terroristas, que a nossa humana UE patrocina, se mudam de malas e bagagens para o nosso mundo. Que o dos outros nós vemos na TV ou na Internet.

Estamos do lado certo da História, nem podia ser de outra maneira. Estamos na vanguarda do que são os Direitos Humanos, juntamente com os EUA, que perderam agora um presidente que fez toda a diferença. Tornou o Mundo um lugar seguro e menos desigual, apesar de ter conseguido a proeza de bombardear mais países do que o seu antecessor, mas tem swag, boa imagem, é engraçado e é negro, o que faz as delícias de alguns que acham que basta mudar o sexo ou a cor de pele do poder para mudar de políticas. Não é, Merkel?

Na foto, ali em cima, está o retrato do que é a UE em 2017 e que nunca poderia ser diferente. Porque foram sempre a economia e as finanças que estiveram na sua mira. A UE que vende refugiados à Turquia – também cheia de liberdades, humanismo e democracia – para que os arrume e os tire das nossas vistas, que a nossa liberdade também é isso. Afastar dos nossos olhos o que nos incomoda, fazer de conta que não existe. Porque Obama falhou em algumas coisas mas. E a UE falhou em algumas coisas mas. E vamos andando de falha em falha, de mas em mas, até que consigamos perceber que, nisto tudo, o que falha é o sistema predador em que vivemos, canibal numa primeira fase e, agora, autofágico.