Cofres cheios e barrigas vazias

Nacional

“Portugal tem os cofres cheios”. Foi com esta tirada insultuosa, perversa, ignóbil, que a ministra das finanças encerrou as jornadas do PSD. Com a sua habitual pose altaneira, almejando o júbilo de uma plateia certamente inebriada pela gloriosa revelação, a responsável política que não foi senão “carrasco” de milhões de portugueses e portuguesas, vem gabar-se de que, afinal, o país “tem os cofres cheios”. Cofres cheios “para honrar os seus compromissos na eventualidade de surgirem perturbações no funcionamento do mercado”, claro está, não vá haver qualquer tipo de dúvidas. E eis-nos então perante o país sonhado por PSD e CDS: um país “de cofres cheios”, mas que obriga crianças a irem à escola nas férias para terem direito a uma refeição digna.

E eis-nos então perante o país sonhado por PSD e CDS: um país “de cofres cheios”, mas que obriga crianças a irem à escola nas férias para terem direito a uma refeição digna

O que foi que aconteceu entretanto neste país ao mesmo tempo que se “enchiam os cofres”? Milhares de famílias eram arrancadas de suas casas devido aos cortes de rendimentos e impossibilidade de cumprimento das suas obrigações. Milhares de pessoas desprovidas de qualquer apoio social entregues à sua sorte, condenadas à mendicância da caridade. Centenas de milhares de jovens atirados para a emigração por políticas recessivas e destruidoras do tecido empresarial. Dezenas (centenas?) de mortos em unidades de saúde que foram decepadas por cortes cegos e racionalizações obsessivas. Milhares de jovens que abandonam os estudos e a possibilidade de cumprirem os seus sonhos por falta de apoios e pelo empobrecimento acelerado das suas famílias. Degradação social, desemprego acentuado, desinvestimento público, obras paradas, progressões congeladas, contratações escassas e precárias, retrocesso económico, mais pobreza, mais infelicidade, mais desespero, mais miséria. A sorte é o país ter “os cofres cheios” para pagar “aos mercados”.

Mas todos sabemos também que não foram só “os cofres” do estado que encheram durante todos estes anos. E encheram à custa do suor e da miséria de muita gente. Os banqueiros, por exemplo, nunca tiveram os cofres vazios. As grandes fortunas aumentaram como nunca. Os milionários continuaram a acumular. Ninguém lhes tocou com um dedo. Ninguém lhes fez frente, antes pelo contrário. Os ricos mais ricos, os pobres mais pobres, a concentração de uma grande percentagem da riqueza nacional nas mãos de meia dúzia, são as estatísticas oficiais que o dizem, é a realidade que o demonstra.

Não se pode pedir a este governo sem ponta de sensibilidade, a estes ministros calculistas e economicistas e desprovidos de elementar humanidade que invertam o rumo, ou corrijam o que quer que seja. Neste momento, protegidos por um presidente da república de igual casta, a impunidade vigora e vigorará por mais escândalos – e são uns atrás dos outros – que venham à tona. Mas fartos deste regabofe e desta falta de pejo pedimos, pelo menos, que se calem. Que se calem. Que parem de insultar as pessoas com tiradas imbecis. Que se resignem à miserável condição de agentes da destruição de vidas e salvação de fortunas. Estamos fartos de tudo o que vos diga respeito. Os portugueses já não aguentam ouvir-vos, os portugueses já não podem sequer olhar para a vossa cara nos ecrãs. Enterrem a cabeça, saiam, demitam-se, desapareçam da política de uma vez por todas.