É disto que Marcelo Costa

Nacional

Foto: Daniel Rocha/Público

O surgimento de uma sondagem que desse, finalmente, vitória ao PSD, era o último sinal de que Marcelo necessitava para pôr em marcha a fase ofensiva de um plano há muito arquitectado/desejado. A contestação das ruas, a fúria dos professores, a insatisfação com salários e pensões, o aumento do custo de vida, ou a significativa intensificação da precariedade laboral, são “critérios” pouco relevantes para Marcelo na sua origem e essência, mas que acabam por “contar” quando são úteis, de alguma forma, para visar ou desgastar o governo. Marcelo percebe “de que lado sopra o vento”, e como “o vento” se alia à cor da camisola, está na hora de, julga ele, assumir a liderança da oposição e, sobretudo, a dianteira mediática do ataque ao governo. Só quem não conhece Marcelo – e o seu longo currículo de profissional da maquinação de bastidores, de oportunismo e do intriguismo político – é que estranha esta situação, que é apenas e só resultado dessa crónica patologia de apego e dependência de mediatismo, de centro das atenções, em estreita aliança com a sua mal disfarçada partidarite.

Isto significa que o Presidente da República, após uma sucessão de indirectas demasiadamente leves para o efeito desejado, se decidiu agora, finalmente, a sacrificar mesmo alguns deveres inerentes à sua posição institucional. Mandou às malvas a prática discreta de todos os antecessores em matéria de relacionamento com o governo, transformando matéria reservada divergente em matéria pública de escândalo e, pior do que isso, em matéria exposta e comentada. Fez da crítica mediática diária – e às vezes bi ou tri-diária – ferramenta de acção política, não se coibindo de ultrapassar todos os limites, a ponto de exigir, ineditamente, a cabeça de um determinado ministro que ele “achou” que deveria sair.

Já a resposta de António Costa, que voluntariamente alimenta e dá gás à polémica, traduz aquilo que parece ser a vontade do próprio de ir já a eleições, antes que seja tarde, ou antes que a situação piore. Mais do que Marcelo, o que mortifica o governo é, na verdade, o desastre das suas próprias políticas, o impacto social das mesmas, bem como a degradação da sua imagem devido a escândalos associados à forma muito própria como o PS se serve do país e não como serve o país. De tudo isto, para o PS, só restará a chantagem nos mesmos moldes em que o fez o desesperado PSD de Passos: o “vem aí o diabo” será agora o “vem aí o Chega”, mistificação que o PS deseja assuste o suficiente para lhe devolver aquilo que, por culpa própria, já perdeu. Ingenuidade, dirão, mas a verdade é que, a este governo de credibilidade em cacos, já pouco mais resta.

No meio desta gincana, o que é certo é que ambos os protagonistas se sentem como autênticos peixes na água, mesmo que fétida. No fundo, adoram estes arraiais. Se Marcelo ama, o António gosta. E quem, por um lado, preza a higiene do espaço público e, por outro, despreza o circo e o folclore de títeres burgueses, não se espanta nem se excita com a sonora mediocridade da situação política nacional. O problema do país e dos trabalhadores, aquilo que verdadeiramente dói no corpo e na carteira, já não se resolve nem atenua grande coisa quando não há circo, e muito menos quando ele está montado. A rejeição de tudo isto, de todos estes protagonistas, de Marcelos e Costas, de PS’s e PSD’s, deste nefasto cabaret em que a cada passo se transforma a chamada “vida política nacional”, deixa de ser uma mera opção. Agora, como há muito, lutar é uma urgência sanitária.