É um avião? é um pássaro? Não… é um Governo PS.

Nacional

*foto de obra da autoria de ± maismenos ±

Independentemente do que venha a ser o resultado institucional da rejeição do programa do PSD/CDS que até agora parece desenhar-se no horizonte, não está em cima da mesa, para já, a construção de um “Governo de Esquerda”.

Quando tal vier a ser uma realidade em Portugal, será certamente resultado de uma movimentação de massas consciente da necessidade de ruptura com o capitalismo e com a consolidação do processo de integração capitalista europeia e não apenas de resultados eleitorais. Mas para já o que está a parecer resultar das eleições legislativas de Outubro é uma derrota do PSD e do CDS, sem que exista necessariamente – como consequência directa – uma substituição automática das suas políticas por outras distintas e de “esquerda”.

A derrota do PSD e do CDS nas eleições e a constituição de uma maioria “atípica” numa conjuntura igualmente “rara” criam factualmente uma nova relação de forças institucional que permite materializar essa derrota na alteração dos protagonistas do Governo. Mas é também possível ir um pouco mais longe do que a habitual alternância sem alternativa. E havendo essa possibilidade, o PCP afirmou que o “o PS só não é Governo se não quiser” logo na noite das eleições e após a divulgação dos resultados. Isso significa que é preciso travar o passo ao PSD e CDS mas também que é possível construir uma política que, não sendo a proposta pelo PCP, nem pela CDU, é melhor para os portugueses do que a prossecução da actual.

A efabulação de que isso corresponde a um “governo de esquerda”,  a manterem-se as premissas conhecidas da política institucional portuguesa e a natureza dos partidos que a compõem, contribui mais para mistificar do que para esclarecer.

Não significa isto que não podemos vir a ter um Governo de Esquerda. Apenas que para já, tudo indica estarmos numa fase muito distinta dessa.

A construção da alternativa patriótica e de esquerda de que o país necessita não surgirá de reuniões entre partidos, mas emergirá da força do povo, da expressão da sua vontade inequívoca de mudar e ousar continuar os caminhos que ensaiou em Abril e que foram travados em Novembro. A direita está em pânico e fez baixar todo e qualquer padrão de dignidade que ainda pudesse ter. Há muito tempo que o grande patronato e o seu braço político (PS, PSD e CDS) não viam tão ameaçado o seu domínio.

E eis que o próprio PS se vê pressionado a definir-se sob pena de poder vir a ser considerado inútil no panorama da democracia partidária. Quem vos escreve não alimenta ilusões sobre de que lado se encontra o PS, mas também não alimenta simplismos. E uma coisa é um PS liberto para fazer o que quer e outra coisa é um PS que não pode fazer o que quer. Todavia, apesar de acossada e desvairada, a direita não está perdida. O grande capital não perde o norte tão facilmente.

Para situarmos a estratégia da direita é preciso compreender que ela se posiciona, neste momento, quase toda no plano das ideias e da ideologia, usando  a mentira, a chantagem, o terrorismo e a manipulação como instrumentos de pressão sobre o povo português, com o empenho descarado de Cavaco Silva.

É preciso compreender que PSD e CDS estão há meses a repetir a mentira do crescimento e a ladainha da recuperação económica, da diminuição do desemprego e do aumento das exportações e do investimento. Na verdade, toda essa construção é falsa e não corresponde à verdade. Na realidade, o país está mais pobre, está mais desigual, menos democrático e mais dependente – no financiamento e na produção. O país produz menos riqueza do que em 2011 e regrediu mais de 15 anos em muitos indicadores económicos.

Mas a insistência nessa mentira funciona como uma luz ao fundo do túnel para milhões de portugueses. E as ideias, não apenas a matéria, também moldam realidades.

Aceitar que o país está em rota ascendente é cair na primeira esparrela de PSD e CDS.

A segunda esparrela é aceitar a ideia de que estamos perante a emergência de um “governo de esquerda”. Porque, independentemente do governo que exercer funções nos próximos anos (ou meses) o país está factualmente asfixiado por uma dívida que foi contraída nos bancos e transposta para a dívida soberana, está factualmente depauperado e com o aparelho produtivo capturado pelos monopólios financeiros e económicos, está factualmente menos capacitado do ponto de vista social para lidar com a exclusão, a pobreza e a miséria, está igualmente depauperado no campo da investigação e desenvolvimento e da produção científica. Ou seja, essa realidade é que é o substrato da política institucional.

E se um Governo PS tomar posse e entrar em funções essa realidade vai continuar a ser o verdadeiro cenário de governação. E PSD/CDS e o seu Presidente estão a fazer todo o caminho actual com os olhos postos no futuro: culpar a “esquerda toda”, o “socialismo”, pelos resultados do desastre que já aí está, mas camuflado pelas suas mentiras e propaganda.

O fio da navalha sobre o que caminhamos é demasiado estreito para equilibrismo – chamar “governo de esquerda” a um Governo liderado pelo PS, ainda que negociando algumas melhorias e medidas positivas para os trabalhadores com o PCP, é começar a tombar já para o lado errado.