O cenário pouco depois das projecções não podia ser mais ameaçador. Marco António Costa e Nuno Melo, de braços no ar, reaparecidos, saídos do buraco onde estavam há semanas, davam vivas à coligação. Na TVI estava Miguel Relvas, o doutor, outra aparição, ufano, de peito cheio e sem vergonha na cara, a dar lições de política e de moral. Perguntassem-me por acaso, há um ano, se veria como possível este cenário e estes figurantes, de semblante vitorioso, numas próximas legislativas, por certo teria de responder algo como isto: «Não brinquem comigo. Isso seria mau demais para ser verdade.» Em boa verdade, as coisas não eram tão luminosas quanto nos pareciam fazer crer.
Os que “ganham sempre” são os banqueiros, os grandes grupos económicos e financeiros, os monopolistas, os interesses instalados, os caciques corruptos, os que são sempre poupados aos sacrifícios e que escapam sempre à justiça.
De facto, um governo que passara anos a ludibriar, a iludir, a criar artifícios, a negar realidades, não podia deixar de ser aquilo que sempre foi. Por trás do circo montado com o sempre precioso embalo da comunicação social e seus comentadores, havia uma coligação de dois partidos que tinha tido, afinal, menos votos que o PSD sozinho há quatro anos. Talvez nunca saibamos com exactidão o que seria do CDS se concorresse sozinho no continente, mas sabemos algo que a comunicação social curiosamente não está a sublinhar: na Madeira, onde concorreu sozinho, o CDS passou de 19101 votos (1 deputado) para 7536 (0 deputados), enquanto que nos Açores a hecatombe foi de 10944 votos (0 deputados) para 3654 votos (e em coligação com o PPM).
Mas se, por um lado, havia os grandes e ufanos vitoriosos, havia por outro que apontar os consequentes derrotados. Noticiou-se uma catástrofe para a CDU, futebolizou-se a coisa, como é normal, repetindo-se a todo o momento que a CDU tinha sido “ultrapassada” pelo BE, como se “a classificação”, em si mesma, tivesse relevância para o verdadeiro fundamento e objectivo desta eleição. Houve até quem afirmasse – e isso vem até na primeira página do JN – que a CDU passou “a 4ª força política”, no que só pode ser visto como assomo de ignorância e de má-fé, dado que a CDU já era a 4ª força política, sendo que, à sua “frente”, desde 2011, em vez do Bloco tinha o CDS. Então mas, afinal de contas, numas eleições que visam eleger deputados e uma assembleia, como ficou a CDU? Isso não interessa nada. Eles “ganham sempre”. O que importa é repetir, de forma acrítica e descerebrada, mesmo que em rigor nada seja dito nesse sentido, que a CDU “ganha sempre”. Dizer que “a CDU diz que ganha sempre” é a grande e verdadeira “cassete” das noites eleitorais. Quanto aos factos, aumentar o número de deputados e o número de votos, naquele que foi o melhor resultado desde há 16 anos, isso só pode ser uma clara e inequívoca “derrota” da CDU. É uma “catástrofe”. Mas não esquecer: eles “dizem que ganham sempre”, “eles ganham sempre”… e siga a rusga.
À parte estas “brincadeiras” e além de toda a espuma da noite eleitoral, a verdade é que há de facto quem “ganhe sempre” por estes dias, pelo menos enquanto PS, PSD ou CDS puderem e tiverem condições e votos para governar. Os que “ganham sempre” são os banqueiros, os grandes grupos económicos e financeiros, os monopolistas, os interesses instalados, os caciques corruptos, os que são sempre poupados aos sacrifícios e que escapam sempre à justiça. Esses sim, com PS, PSD ou CDS esses “ganham sempre”. Hoje os agiotas continuam a banquetear-se com a nossa dívida crescente. Hoje os desempregados continuam de futuro incerto e com a vida penhorada. Hoje os salários e as pensões continuam em níveis miseráveis. O país continua pior, o povo continua sacrificado.
Da parte da CDU, o que dizíamos antes, repetimos agora. Não há qualquer solução nem resposta aos problemas ou anseios de quem sofre nos partidos que nos trouxeram até aqui. Não há nada de positivo a esperar de PS, PSD e/ou CDS. Só a luta coerente do povo e dos trabalhadores, uma luta que tem de ser mais persistente, mais presente, mais comprometida, mais militante pode fazer frente ao situacionismo da desgraça e só uma mudança efectiva pode conduzir à construção de um país mais justo e mais próspero. Para esta grande luta que hoje, como sempre, continua, podem contar com a CDU.