O BE defende um golpe militar na Venezuela?

Nacional

O Bloco de Esquerda publica um artigo inenarrável contra a Venezuela que defende um golpe militar, assinado por Tomás Marquez, que repete o argumentário utilizado pelos governos, partidos de direita e órgãos de comunicação social alinhados com o imperialismo. Vamos desmontar, ponto por ponto, uma posição que se inscreve na linha histórica do BE de se orientar na sua reflexão sobre política internacional por aquilo que é dito por Washington ou pela União Europeia.

1. “não foram compridos os requisitos que são exigidos em Democracia, para a realização de eleições livres e democráticas”.

Depois da violência desatada pela oposição nas ruas da Venezuela, Nicolás Maduro apelou à paz e propôs reuniões com os líderes opositores que se vieram a realizar na República Dominicana com o apoio do Vaticano e de José Luiz Rodriguez Zapatero, ex-chefe do governo espanhol e antigo secretário-geral do PSOE. Desses diálogos, as duas partes chegaram a acordo sobre convocar eleições. Recordemos que a oposição fez uma campanha recolhendo assinaturas para convocar um referendo que destituísse Nicolás Maduro e conduzisse a eleições antecipadas. Ou seja, houve um princípio de acordo para a realização de eleições que, inexplicavelmente, uma parte da oposição logo a seguir recusou. Ainda assim, o presidente da Venezuela convocou eleições nas quais participaram, para além do próprio, outros candidatos opositores, apesar do boicote de uma parte.

Sobre a validade democrática do plebiscito basta-nos recordar o que disse Jimmy Carter sobre as eleições venezuelanas. O ex-presidente norte-americano que monitorizava eleições em todo o mundo há mais de uma década disse que “o processo eleitoral na Venezuela é o melhor do mundo”. Nicolás Maduro ganhou com 67,84% dos votos. O opositor Henri Falcón teve 20,93% e o opositor Javier Bertucci chegou aos 10,82%.

2. “Nicolás Maduro e seu partido mal denominado Socialismo do século XXI, não são mais do que usurpadores do poder através das armas, das ameaças e da corrupção, enganando o seu próprio povo e levando-o a uma ditadura, com a promessa de um novo estado social-democrático.”

Desde que Hugo Chávez chegou ao poder pela via eleitoral, em 1998, foram realizadas dezenas de eleições e referendos na Venezuela. Na maioria, ganhou o chavismo. Noutras a oposição, que, diga-se, nunca renunciou aos cargos que elegeu reconhecendo assim as eleições. A única vez que houve um golpe violento protagonizado por “usurpadores do poder através das armas” foi em 2002 quando um sector golpista do exercito, em conjunto com os partidos da oposição, sequestrou Hugo Chávez. Apesar disso nenhum partido da oposição foi ilegalizado.

3. “Em 20 anos de demagogia destruíram uma nação inteira, saquearam as sua riquezas, desapareceram com as suas reservas internacionais, expropriaram tudo o que havia e o que não havia também, expropriaram os sonhos e a vida dos venezuelanos e dos estrangeiros que fizeram da Venezuela a suas casa e a sua Pátria.”

Durante meio século, o sistema político e económico defendido pela oposição, por Tomás Marquez e, pelos vistos, pelo BE, afundou na miséria milhões e milhões de venezuelanos. Às crianças davam-lhes comida para cão para que não morressem de fome, o analfabetismo grassava pelo país, uma parte da população nunca tinha visto um médico e viviam em casas de cartão como cantou Ali Primera. Os avanços operados pela revolução bolivariana, mesmo com as consequências da actual guerra económica sobre o povo venezuelano, são indesmentíveis. Ao contrário de antes, o lucro do petróleo não ficou nas mãos da oligarquia mas foi repartida com a população. Como? O analfabetismo foi erradicado como atestou a UNESCO, a Venezuela tem, hoje, uma das mais elevadas taxas de acesso ao ensino universitário do mundo, construi 2,5 milhões de apartamentos onde alojou milhões de famílias e encheu as favelas de consultórios médicos. A água, electricidade, gás, combustível, telecomunicações são praticamente gratuitos. É a oposição que quer expropriar tudo isso e devolver o poder às elites.

4. “Cabe ao povo venezuelano, aos militares e à comunidade internacional, em cumprimento dos artigos 232, 233 e 350 da Constituição da República Bolivariana da Venezuela, reestabelecer a ordem democrática no país.”

Não há muito a dizer. Tomás Marquez e o BE, por intermédio, apelam a um golpe militar que cumpra os sonhos molhados da oligarquia venezuelana. Assim, sem esconder ao que vão, sustentam a tese de que Nicolás Maduro não é o presidente legítimo quando foi eleito por 67,84% dos votantes e tomou posse no Supremo Tribunal de Justiça porque, como diz a Constituição, a Assembleia Nacional não estava habilitada para o fazer porque a oposição não quer substituir por outros seus deputados desse órgão que foram eleitos em condições anormais.

A revolução bolivariana pese as suas contradições e erros próprios de um processo que apenas tem duas décadas de existência protagonizou avanços sociais, económicos, políticos e culturais. É uma revolução democrática assediada por todos os lados e também por esquerda que se diz democrática mas que usa a bússola do imperialismo para se definir. A derrota do chavismo na Venezuela seria um rude golpe e uma vitória do capitalismo.

Há cem anos, também havia na Alemanha quem se dissesse de esquerda mas se alinhasse com o imperialismo. Foi essa esquerda, dita democrática, que quando chegou ao poder assassinou violentamente Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht. Hoje são os mesmos que não têm problemas em apoiar invasões na Líbia e golpes na Venezuela.

6 Comments

  • Nunes

    24 Janeiro, 2019 às

    Esta pequeno ignorante ou provocador (talvez oportunista), incluído no grupo do BE, chamado de Tomaz Márques (e que mais valia ser parte dos vândalos que destroem Caracas e outras cidades venezuelanas nesta altura), inclui no grupo de demagogos e tiranos que governaram a Venezuela nestes últimos 20 anos, os nomes de Hugo Chávez e Nicolás Maduro. Não reconhece as conquistas e os direitos alcançados pelo povo venezuelano, desde o começo da revolução bolivariana. Não reconhece as conquistas na saúde, na educação, na cultura e habitação. Vai ao ponto de reconhecer, como presidente interino, o fantoche Juan Guaidó (tal como fez Mike Pence, Donald Trump e todo o aparato bélico norte-americano, estabelecido no Pentágono). Ou seja, uma voz deste «BE» impõe a sua opinião gratuita, sem nexo e sem esclarecimento algum das partes envolvidas neste dito «Bloco». É tudo manifestado, acreditando ser uma linha de pensamento avançada, sem ordem e sem conceito. Interpretam tudo de forma a não perder o barco das sondagens e das audiências na comunicação social dominante.

  • Vitor Mendes

    20 Janeiro, 2019 às

    Sobre o BE, digo simplesmente o seguinte. Não basta dizer que se é isto ou aquilo. Dou como exemplo,o PS diz-se socialista, mas se analisarmos as suas propostas, as suas politicas, verificamos que têm mais haver com a social democracia. Quanto ao BE, pode dizer o que quiser, o que conta são as suas posições e as medidas que apresenta, e isso, leva a que se identifique como coisa muito confusa para enganar os incautos. Para que se possa dizer que se é de esquerda, tem de se ser real todos os dias e não quando nos convêm, demonstrando no concreto, quais as soluções para os problemas reais existentes. E isso, não se encontra no BE como se tem vindo a verificar no dia a dia.

  • Francisco Apolónio

    18 Janeiro, 2019 às

    O que esperar, de uma força partidária ou partido político, se no essencial e fundamental é a favor e está ao serviço do grande capital?

  • Nunes

    18 Janeiro, 2019 às

    A posição política do BE sobre a Venezuela é igual às posições da oposição de extrema-direita venezuelana, do famigerado Luis Almagro da OEA, do grupo de Lima e do secretário de estado norte-americano Mike Pompeo. Será caso para dizer: «Parabéns, BE, pelo vosso esforço em matéria de política internacional.»

  • Antonio Jose Fernandes

    18 Janeiro, 2019 às

    Estas afirmaçôes, apenas Vêm confirmar aquilo, que, um cidadão minimamente informado pensa sobre o posicionamente político do "BE". Um partido, formado, financiado,e promovido escandalosamente, por,uma comunicação "Social",defensora dos grandes interesses e com a principal missão, de ofuscar a influência do PCP, na sociedade portuguesa.

    • Unknown

      20 Janeiro, 2019 às

      Sr. Antonio José Fernandes, faço minhas suas palavras!

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