Odessa: 02.05.2014-02.05.2015

Nacional

Cumpre-se precisamente hoje um ano sobre o massacre de Odessa, a mais negra página da cidade heróica após os anos da Grande Guerra Pátria de 1941-1945. Quarenta pessoas foram encurraladas e depois assassinadas na Casa dos Sindicatos da cidade. Eram dirigentes e activistas sindicais, boa parte dos quais membros do Partido Comunista da Ucrânia. Um ano depois os culpados materiais e morais do crime continuam por punir.

Odessa foi provavelmente o mais miserável dos crimes da Junta de Kiev fora das regiões de Donetsk e Lugansk, embora outras formas de violência se tenha institucionalizado no ocidente ucraniano desde que os cabecilhas do protesto “Euro-Maidan”, fortemente apoiados e financiados pelos Estados Unidos e pela União Europeia, se apoderaram do poder. Perseguições, intimidações, espancamentos e até assassinatos passaram a fazer parte do dia-a-dia do país. A leste uma guerra fratricida procurou fazer vergar pela força a resistência de populações que desde o primeiro dia recusaram reconhecer a legitimidade de autoridades impostas pela força, sem qualquer representatividade nem apoio nas regiões em torno da Bacia do Don.

Humilhado por milícias populares e por brigadas internacionais de solidariedade, maioritariamente compostas por militantes sem experiência militar prévia, o Exército de Kiev vingou-se das populações do leste descarregando a sua artilharia sobre aldeias indefesas e centros urbanos com grande densidade populacional. Em paralelo, o batalhão Azov – herdeiro directo dos mesmo nazis e colaboracionistas derrotados na guerra de libertação 1941-1945 – dedicou-se a aterrorizar civis, chegando a linchar ucranianos acusados de colaboração com a “ocupação russa”, prática comum nos tempos em que as SS alemãs procuravam, interrogavam, torturavam e enforcavam partisans nas florestas daquela frente de batalha.

É curioso que, setenta anos depois da derrota incondicional da Alemanha hitleriana, as autoridades de Kiev tenham tomado a iniciativa de fazer tombar os monumentos que em todo o território ucraniano evocam o passado de resistência soviética contra a Wermacht e as unidades de elite dos exércitos fascistas de alemães e seus aliados. A Ucrânia contribuiu de forma particularmente dura para o esforço de guerra da URSS, como bem revelam obras literárias de enorme valor (destaco “Morreram pela pátria”, do Nobel soviético Mikhail Cholokov). Boa parte da lista de heróis da URSS são ucranianos, numa lista em que apenas os russos contam com maior número de cidadãos distinguidos.

De 2014 para cá a Ucrânia avançou para um ruinoso empréstimo junto do FMI que a deixará à mercê dos ditames da banca internacional por muitos e maus anos. O governo de Arseniy Yatsenyuk, o homem que em tempos defendeu a construção de um muro a dividir a Ucrânia da Rússia, impõe sacrifícios crescentes a uma população empobrecida e humilhada por vinte e cinco anos de recuperação capitalista. O Partido Comunista da Ucrânia enfrenta um criminoso processo de ilegalização, sendo desde há cerca de ano e meio impedido de desenvolver a sua actividade legal em zonas a ocidente de Kiev, em particular em torno da cidade de Lviv. A União Europeia, sempre tão rápida na condenação de atentados à liberdade (tal com a atende), cala-se e é cúmplice evidente no processo de fascização de um país que promete integrar-se, no prazo de cinco anos, nas estruturas políticas, económicas e militares (EU e NATO) do chamado “ocidente”.

Odessa aconteceu há um ano e aposto que disso não se ouvirá falar nos noticiários portugueses deste dia 2 de Maio de 2015. A Ucrânia agora “é dos nossos”, e “aos nossos” não se aponta o dedo. O tipo de “liberdade de expressão” que impera no civilizado espaço europeu submete-se aos “interesses estratégicos” dos nossos “aliados”, mesmo que estes sejam (como são) a antítese dos valores defendidos pela Constituição da República Portuguesa e uma violação grosseira dos mais elementos princípios de honestidade por parte dos media do burgo.

Pela nossa parte aqui fica a referência. Para que não se esqueça Odessa, o massacre de 2 de Maio de 2014 e as suas vítimas.