Para qualquer ofício ganho jeito

Nacional

Aos sábados à noite, ao serão com a Princesa B., costumamos fazer uma espécie de desgarrada via Youtube. À vez, cada um escolhe uma música para o outro ouvir. Procura-se a letra para que possamos cantar os dois quando um não sabe. Lembrei-me, não sei bem por que motivo, desta música.

Não está aqui em causa o particular gosto musical ou deste ou daquele artista que compunha o projecto Rio Grande. Antes está uma melodia de que gosto, que remete para a Galiza e para as músicas de inspiração celta, uma trova medieval, como medievais são os tempos que hoje vivemos, e uma letra que pega no nosso imaginário e leva-o para os anos 60 do século passado. Ou seja, para 2013 do século XXI.

Hoje mesmo o público faz manchete com os seguintes dados: Portugal será o único país a sair da crise com menos população. Das duas ideias, só uma é verdadeira: Portugal tem menos população. Quanto à saída da crise, parece-me que o Público está a falar do fim da ingerência da Troika em Portugal, o que, por si só, está longe de significar que a crise acabou.

Uma oferta de emprego que chegou via CTT, com o carteiro a bater ao postigo. Daqui a uns tempos, lá terá o sujeito da música de ir a uma mercearia buscar o sobrescrito com a oferta de emprego. E o um segundo que mudou a vida de centenas de milhar de pessoas que saíram da zona de conforto. Como se alguém pudesse sentir-se confortável a viver hoje em Portugal.

Os milhares que saíram de Portugal não vão voltar, porque ninguém quer sobreviver num país onde se trabalha até morrer e se morrerá a trabalhar, sem horários, sem direitos, só deveres, entre obedecer e pedir permissão. O Fausto bem dizia que “os que vivem no Mundo/só vivem querendo ganhar/mesmo matando aquele/ que morrendo, vive a trabalhar”. E cá estamos nós a caminho desse destino que, todos os dias, nos vendem como único.

Quando eles, os que partiram, se sentaram frente ao lume a matutar, terão sempre pesado tudo, os dias de perder e de ganhar. O que perderam o que poderiam conseguir. E o que perderam não pode deixar margem para esquecimento nem perdão de quem os afastou das famílias e dos amigos que são família. Das suas histórias, o que ficou tinha muito mais texto, não cabe em nenhum verso deste Mundo.

Das histórias de quem parte hoje sabemos que vão em busca de melhor, nem que seja como aprendiz de qualquer coisa, mesmo quando saem com formação qualificada. Porque mais vale ser trolha na Europa do que neste país que é, cada vez mais, uma extensão da África subdesenvolvida.

“Quando a crise acabar”, segundo o Público, Portugal será um país em que, todos juntos, os que cá ficam, viverão num sítio – sim, um sítio – onde mesmo juntando tudo o que nos deixaram, sobrará fundo.

Resta-nos a esperança e a convicção de que a vida dá muitas voltas, tantas ou mais que o Mundo. Tomemos então nas nossas mãos os destinos dela.