Quando a banca esmaga os seus trabalhadores e o Estado assina a sua execução

Nacional

“Já não aguento mais, não consigo. Tornei-me numa pessoa execrável, nem me reconheço. Acordo a meio da noite a chorar, tenho ataques de pânico, não durmo sem comprimidos! Nem sei como o meu marido me atura assim. Há dois anos. Acordo, levanto-me da cama e estatelo-me no chão.

Todos os dias entro ali, sorrio. De cada vez que o telefone toca acho que vai ser nesse momento. De cada vez que o meu director olha para mim, acho que me vai despedir. De cada vez que chama um de nós acho que vai ser despedido.

Não aguento. Estou sempre a pensar que me vão fazer alguma.

Por 832 euros por mês estou nisto há dois anos. Sem aumentos há 7.

Perdi tanta coisa. Há um ano perdi um filho. Tenho 44 anos e estou reduzida a isto. Nunca mais vou conseguir engravidar. Perdi o meu filho por estar assim e cheia de medicação. Não posso continuar. Não posso. Não aguento.”

Esta não foi a primeira vez que ouvi tudo isto. E não será a última, certamente. Assim é a banca: espreme, quebra, destrói.

A banca que se divide em múltiplas empresas, todas do mesmo grupo mas todas sem ter nada a ver umas com as outras. Que detém empresas de contratação (Como o BES detém a Multipessoal mas os trabalhadores do BES contratados pela Multipessoal são trabalhadores da Multipessoal e não do BES) para não contratar trabalhadores com direitos. Que paga salários de 700 euros a licenciados. Que despede, despede, despede, sempre com «acordos de reestruturação» com o alto patrocínio do Governo que lhes dá as quotas para que seja a Segurança Social a pagar os subsídios de desemprego enquanto milhares vão para as ruas.

Rescinde, pagamos mais do que diz a lei. Rescinde, o Governo vai dar-nos as quotas.

A determinada altura nem se sabe quem é o administrador da banca e quem é o ministro, o despedimento, afinal, tem o aval dos dois.

E é assim que se vai passando, enquanto seres humanos já nem se reconhecem, a lei molda-se ao sistema para o beneficiar, os ministros assinam todas as portarias necessárias e vamos assistindo a isto. «Não posso continuar. Não posso. Não aguento».

Que haja depois disto uma resistência maior do que a que C. já teve. Porque o seu acto último de resistência foi ficar sozinha na empresa que tem o mesmo nome do banco mas que não é banco. Resistiu. E pode estar de cabeça erguida quando olhar para trás. Num futuro que esperamos que seja diferente, porque contaremos com ela para o construir.