São todos iguais

Nacional

Ontem, na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, teve lugar uma “conversa de café”, organizada pelo Grupo Universitário de Debates e Opiniões, com os convidados Manuel Loff e Pedro Ponte e Sousa, sobre as eleições do próximo domingo. Serviu para, entre outras coisas, num ambiente descontraído, se discutirem não só temas relevantes para as eleições, discutir a ideologia e a sua ausência, que mais não é do que a existência da ideologia dominante, o sistema eleitoral, o papel mediático e das redes sociais e os fenómenos de extrema-direita.Por falta de tempo – e não de vontade – outras questões foram abordadas e necessitavam de uma abordagem mais densa. Por exemplo, o que leva as pessoas a dizer que os partidos são todos iguais? De facto, e como foi referido no evento, há igualdades que, em larga medida, beneficiam a abstenção. Por exemplo, quando PS e PSD/CDS aplicam exatamente as mesmas políticas, é indiferente votar num ou noutro. A parte dos “iguais” está resolvida. A parte do “todos” tem que se lhe diga e também sobre isso se falou. Não podemos dizer que são todos iguais, porque não o são de facto. O argumento, por exemplo, da “distância entre eleitos e eleitores” é um falso argumento. Ribeiro e Castro referiu-o, há uns tempos, num Prós e Contras, para defender a completa subversão da democracia que seriam os círculos uninominais.

Ribeiro e Castro, do CDS, limitou-se a transferir a realidade do seu partido para a realidade de todos os partidos. Que os deputados que o CDS elege nos diversos distritos não tenham contacto com essas populações, é um problema do CDS, não da democracia nem todos os partidos. Dos que compõem a CDU, não é. Aliás, a CDU, no final de cada sessão legislativa, faz o balanço da sua atividade em todos os distritos do país.

Os partidos não são, também por isso todos iguais. Como não o são na sua forma de funcionamento interno. No entanto, as sucessivas alterações à lei dos partidos políticos e ao financiamento de campanhas, têm procurado fazer com que sejam todos iguais, na forma, no funcionamento e, daqui a uns tempos, se a UE caminhar no sentido em que caminha, os mesmos conteúdos. Vem isto a propósito de uma notícia de ontem, no Público, onde pode ler-se que apenas a candidatura de Marisa Matias às presidenciais apresentou contas certas. Note-se, como apontamento, que a expressão “contas certas” tem estado em destaque nesta campanha, pelo que o seu uso no título terá pouco de inocente.

Vejamos, então, quais foram as contas erradas apresentadas pela candidatura de Edgar Silva, apoiado pela CDU – PCP/PEV:

“As contas do candidato comunista, Edgar Silva, apresentaram apenas uma falha: despesas relacionadas com ajudas de custo de pessoal cedido pelo PCP, com “deficiente discriminação” de cada despesa e sem os respectivos documentos que justifiquem o pagamento das ajudas de custo.”

Ou seja, uma candidatura, para ter contas certas, tem de pagar ajudas de custo, porque a lei e a respetiva entidade que fiscaliza as contas, não considera que possa haver trabalho militante, que é feito sem que seja pago. Não há espaço para a militância, porque a lei entende que é impossível alguém trabalhar em prol de um ideal sem esperar um retorno pessoal direto por esse trabalho.

Daqui partimos para outra questão, que é a profissionalização do que é “ser político”. Confesso que tenho muita dificuldade em entender o que é ser político como profissão. Que haja quem na política procure fazer disso a sua vida – e o consiga – é uma coisa. Que a política seja uma profissão é outra diferente. Nenhum membro eleito seja para que órgão for passa a ser mais político do que o comum mortal. Está a desempenhar uma função para a qual foi eleito por um prazo definido, com um mandato, que nada garante que seja renovado, se a democracia funcionar normalmente.

Para já, ainda é assim. Até que uma qualquer maioria decida instituir que só políticos profissionais, que nunca fizeram mais nada na vida que não seja saltar de órgão em órgão, possam fazer política no parlamento, câmaras, assembleias municipais ou de freguesia, completamente desligados do que é a vida dos comuns mortais e do impacto que as suas decisões têm nela. É também por isso que não somos todos iguais. No PCP, ninguém é beneficiado ou prejudicado por desempenhar um cargo público. Também por isso, somos diferentes.

1 Comment

  • Nunes

    3 Outubro, 2019 às

    O BE aparece como tentativa de apagar o PCP e a CDU da política e das campanhas eleitorais. Soa um pouco ao que se fez com o MRPP (e o seu símbolo da foice e o martelo) a seguir à revolução.
    Igual ao PS de Mário Soares, o BE é uma máquina de oportunismo e de promoção pessoal. O problema são as falhas no controlo da disciplina dentro deste partido e, para isso, temos o caso «Ricardo Robles» que ainda não foi tocado nesta campanha (pela comunicação social, inclusive).
    Até parece que existe uma espécie de pacto entre o sistema dos partidos à direita (onde se inclui o PS) e o BE que é o seguinte: «Ajuda-me a destruir o PCP e eu ajudo-te a subir na vida política».

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