Pude acompanhar em directo parte do discurso do dirigente neonazi Oleh Tyahnybok na praça epicentro das atenções mediáticas de meio mundo, no centro da cidade de Kiev. Tyahnybok, que é um dos homens de mão dos norte-americanos na Ucrânia, não esconde a sua russofobia nem a vinculação do seu projecto político ao pior do racista anti-semita. Mas em Portugal a visão que se construiu dos conflitos de Kiev é outra. Sem surpresas.
Leio entretanto no site do Expresso que o governo português apoiará as sanções que a União Europeia se prepara para impor à Ucrânia. Através do secretário de estado dos Assuntos Europeus, Bruno Maçães, o governo PSD/CDS já veio afirmar, do alto da sua sapiência e superioridade moral, que o “Presidente Ianukovitch tem de perceber que é o principal responsável pela repressão e pela violência em Kiev e em outras cidades”. Maçães diria o contrário daquilo que disse com a mesmíssima (falta de) convicção se o alinhamento de Bruxelas fosse o oposto.
A situação ucraniana ilustra bem o valor instrumental que a extrema-direita tem no seio do campo político em que se integra: o da defesa canina dos interesses da burguesia (nacional e internacional). A União Europeia sabe bem quem apoia – e como apoia – no complexo quadro ucraniano e não hesita por um momento em sacrificar no altar dos sacrossantos interesses que a estruturam as vidas daqueles que se batem contra o fascismo, num país que já viveu por mais de uma vez o jogo imperial e fascista alemão.
O perigo da situação ucraniana está a ser mal avaliado pelos Maçães desta vida. E se por um lado é verdade que os Maçães portugueses nada mandam nem nada podem no contexto internacional, limitando-se a cumprir as ordens com origem em Berlim, não é menos verdade que de Maçães (eventualmente mais bem falantes mas certamente mais poderosos) da mesma estatura ética está a União Europeia cheia.
O jogo perigoso que desde 1991 Estados Unidos e Alemanha desenvolvem ao longo da fronteira russa é na verdade um problema sério, com consequências imprevisíveis que ninguém que se bata verdadeiramente pela paz pode ignorar. O avanço da NATO em direcção às fronteiras da Federação Russa, a tentativa de instalação (ou efectiva instalação) de infraestruturas militares em territórios contíguos à Rússia e as provocações que ao longo dos anos governos fantoches da região têm levado a cabo contra os interesses russos (a Geórgia tem sido neste domínio imbatível, o que aliás lhe valeu vexante derrota no conflito osseta, em 2008) são realidades que devem ser tidas em conta na análise da complexa situação ucraniana.
De resto é sabido que Estados Unidos e Alemanha/UE se procuram posicionar de forma a disputar influência-chave junto do governo ucraniano em caso de eventual mudança política naquela ex-república soviética. Sobre o assunto aconselho a leitura do pequeno artigo “O Boxeur-electrão e outras peças” assinado por José Goulão na página Odiário.info.
Toda a solidariedade com a Ucrânia e o seu povo. Toda a solidariedade com os comunistas ucranianos e com os imigrantes de outras nacionalidades que de súbito aparecem como alvos da violência racista dos fascistas armados em Kiev, Lviv e outras cidades do país. Toda a solidariedade aos anti-fascistas, veteranos do exército vermelho e outros democratas, que independentemente da sua opinião/posição sobre o governo de Viktor Ianukovitch compreendem o perigo que representa para a Ucrânia a emergência de grupos e bandos neonazis financiados e apoiados pelos blocos político-militares “ocidentais”.
O fascismo não passará.