Um novo ano, uma nova Europa

Nacional

A crise europeia continua bem presente nas nossas vidas, quem só ouvir os discursos da propaganda habitual poderá, por breves momentos, pensar que vivemos na Europa do progresso e que estes anos de recuo foram um lapso que será rapidamente corrigido por actos messiânicos, que prometem elevar a União Europeia (UE) à sua posição de potência mundial. A realidade mostra-nos uma UE a trote dos poderosos, um mercado único que vende a dignidade humana como outra qualquer commodity e políticas comuns que acentuam a, já evidente, divergência entre países. O domínio económico cresce com as assimetrias de crescimento impostas pelos mecanismos criados e apoiados por PS, PSD e CDS. Pelo caminho, o capital voraz serve-se dos reféns do euro para engolir todos os serviços públicos e funções sociais do Estado, sobre a égide das que se chamam “reformas estruturais”. Aos trabalhadores ficam as dívidas ilegítimas, deixadas para trás por governos em conluio com a alta finança, que especulou, e especula, com dinheiros público e privados num deboche cuja dimensão estamos longe de saber o fim.

Dívidas pagas com suor do trabalho, cada vez mais precário, pior remunerado e tantas vezes sobre a humilhação de direitos duramente conquistados esfumados de um dia para o outro, para alimentar a máquina da maximização do lucro. Junker que se sucede a Barroso, normal dança de cadeiras, não configura nenhuma mudança e muito menos uma alternativa. É mesmo a figura perfeita da UE deste modelo económico podre, responsável pelo branqueamento e evasão fiscal, de somas equivalentes a orçamentos de países inteiros, por parte de várias empresas enquanto ministro do Luxemburgo – tudo legal está claro!

É preciso uma acção imediata na UE que se configure uma alternativa às políticas erradamente seguidas até hoje.

Uma alternativa que não tente asfixiar prontamente o desejo de mudança nos países mais devastados e que não classifique como instabilidade política actos tão necessários à democracia como eleições.

Uma alternativa que seja compatível com a renegociação das dívidas soberanas, principal garrote imposto aos países. Esta renegociação é não só inevitável como o único caminho para o crescimento económico e progresso social. Já se encontram isolados os que afirmam, com planos baseados em exercícios numéricos delirantes, que a dívida é sustentável, quanto mais pagável! É hora da Europa enfrentar quem vive da usura da dívida pública e da dívida externa de nações, em vez de cobrir os povos sobre uma austeridade desenhada para transferir os rendimentos do trabalho para o capital.

Uma alternativa que reveja a União Económica e Monetária e do Pacto de Estabilidade, que mantém países reféns da moeda única liderada por um BCE com falsa autonomia e orientado pelas políticas monetaristas alemãs. Que siga o caminho da restituição do poder de decisão sobre os fundamentos da economia ao povo, soberanos da nação, tal como o controlo sobre a moeda. Se ao povo não foi pedida a opinião sobre a entrada na moeda única, que seja agora claro quais as vantagens e desvantagens do euro e soberana a sua decisão sobre a sua permanência. É essencial que os países, que agora são reféns da sua própria moeda, tenham condições para se prepararem para reporem em circulação uma moeda própria que possam controlar.

Uma alternativa que revogue de imediato a União Bancária tal como o Mecanismo Único de Resolução, o primeiro que objectiva a concentração e centralização do sector bancário e o segundo que se demonstrou, com o caso BES/GES, ruinoso para os recursos públicos, impondo uma reprivatização com dinheiro público.

Uma Alternativa que revogue de imediato o Tratado Orçamental, instrumento fundamental da continuidade e legitimação das políticas de austeridade nacionais. É já claro que os tratados, longe de estarem escritos na pedra, são alterados ao sabor das vontades dominantes.

Uma Alternativa que traga um fim imediato às negociações do Tratado Transatlântico de Comercio e Investimentos (TTIP), negociações estas que se encontram rodeados de um secretismo impróprio e indigno numa democracia. O TTIP tem capacidade de representar o maior retrocesso ao progresso social europeu e mesmo mundial. Representará a agudização da lei do mercado sobre os Estados, estando mesmo os interesses privados protegidos das leis e tribunais nacionais!

Uma alternativa que seja baseada na defesa do emprego com direitos e das funções sociais dos Estados. Não haverá crescimento enquanto milhões de desempregados se mantiverem marginalizados da economia. É preciso eliminar a precariedade laboral e trazer de volta o caminho da redução dos horários de trabalho. Todos os cidadão têm direito a uma vida digna e para isso o direito ao trabalho e ao ócio.

Uma Alternativa que se bata pela defesa dos sectores produtivos e dos serviços públicos. Políticas como a Política Agrícola Comum devem ser revistas tendo em conta as necessidades agro-alimentares nacionais, dando protecção à produção local e sustentada. Políticas de apoio ao desenvolvimento industrial, tendo em vista a modernização industrial dos países deficitários eliminando diferenças nos índices de produção tantas vezes usados na humilhação dos trabalhadores, que em nada estão relacionados com estes. Restituição da soberania aos Estados permitindo o seu direito de intervenção nos sectores e indústrias que sejam estratégicos ou de interesse nacional, tal como nas Zonas Económicas Exclusivas e na sua exploração. Políticas concretas que defendam e promovam os serviços públicos, classificando-os como direitos fundamentais e inalienáveis ao interesse de privados ou a fins lucrativos, estando incluídos nestes a saúde, educação, transportes entre outros.

Uma alternativa que alicerce a Europa na solidariedade, onde a convergência, a cooperação e a paz sejam os grandes objectivos. Onde o progresso social seja a nossa bandeira.

* Autor Convidado
Tiago Domingues