A crise da dívida

Nacional

Em 1999, quando Passos Coelho iniciava a sua caminhada de ignorância em relação aos pagamentos à Segurança Social, eu estava a um ano de entrar na redacção de um jornal para o meu primeiro trabalho a sério, depois de passar pelos transitários – era praxe, por aqui – e por outras aventuras relacionadas com o mundo do futebol. Em Outubro de 2000 cheguei ao sexto andar do entretanto assassinado O Comércio do Porto e apaixonei-me por aquilo tudo. Tive de “colectar-me” e comecei a passar recibos verdes. Ao fim de um ano, acabou a isenção e era preciso começar a pagar a à Segurança Social.

E assim foi. Saí d’O Comércio passado algum tempo e não sabia – culpa minha, não sou perfeito mas não era deputado e tinha 20 anos – que tinha de cessar actividade. Não o fiz e, passados uns anos voltei aos recibos, fazendo os descontos.

Quando me apercebi do erro – não fui notificado -, fui à Segurança Social (SS) para regularizar a situação. Toda. Perguntei como seriam negociadas as prestações – não seriam. A SS informou-me então que o pagamento ou era feito na totalidade do valor da dívida mais os juros ou teria de pagar cerca de 300 euros por mês: o valor normal do desconto mais os meses em atraso e os respectivos juros. Todos os meses. E assim foi até nascer a minha filha.

Nessa altura, tinha duas opções: ou pagava à SS ou dava uma vida digna à minha filha. Por incrível que possa parecer, optei pela segunda hipótese. Tempos depois, chegou a carta com o incumprimento do pagamento das prestações. Então com uma situação mais estável recomecei os pagamentos. Para meu espanto, passados uns meses, a minha entidade patronal recebeu uma notificação da SS para penhora do salário por uma dívida à SS.

Afinal, não tinha sido devidamente informado pelos serviços e havia mais a pagar. Outra dívida, desta vez de 5.000 euros, em cima da dívida que já estava a pagar. A solução foi recorrer à banca e efectuar um empréstimo que ainda hoje pago.

Na mesma altura em que fui notificado, recordo-me que encontrei vários camaradas que trabalhavam ou tinham trabalhado também em jornais, uns mais velhos, outros mais novos, mas estávamos todos ali para pagar.

Como eu, outros terão sido vítimas dos crimes que cometeram inconscientemente, outros informados que os descontos estavam a ser feitos pelas empresas, que recorriam abusivamente a trabalhadores a recibos verdes e que a então IGT, agora ACT, fechava os olhos ou fazia o favor de informar antecipadamente o patrão que iam visitar determinadas instalações.

Posto isto, eu e mais alguns milhares tivemos o azar de não ver prescritos os nossos processos ou de dar-nos ao luxo de pagar quando nos apetecer ou, sequer, de ir ao bolso e sacar 3.000 euros para pagar uma parte da dívida – presumindo que a lei tenha sido alterada, porque só podia pagar-se mesmo ou a totalidade da dívida ou, no caso das prestações, o valor mensal mais os juros – somos uma merda de uns azarados.

Estranho é que, na roleta, a bola caia sempre no buraquinho dos filhos da puta do costume.