Ambiente, Classe e Transformação

Teoria

Refletir seriamente sobre a situação ambiental atual requer, obrigatoriamente, uma análise materialista e dialética da realidade, como aliás Engels prova no seu livro “A Dialética da Natureza”. Esta é uma condição absolutamente necessária pois, se da simbiótica e destrutiva relação entre sociedade e ambiente chegámos à condição do dia de hoje, é, também, através desta que superaremos os problemas que têm vindo a degradar o meio ambiente. Essa superação passa inevitavelmente pela libertação das amarras do sistema capitalista e pela construção do ser humano novo, livre, dono do seu destino e em profundo equilíbrio e respeito com o próximo e com o planeta. É a partir desta premissa que o ser humano tem de trilhar o caminho para a sua emancipação. Na ciência, surgem desde logo pistas para forjarmos o nosso caminho: o princípio de Le Chatelier. A vida é uma equação química de múltiplos reagentes e produtos, resta-nos, portanto, pela força do trabalho e da unidade encontrar o equilíbrio entre as forças produtivas, as necessidades da revolução que está por vir e o planeta, que nos oferece finitos, mas úteis, recursos.

Desde os primórdios da civilização que se foi começando a construir a barbárie. É por via da exploração e da usurpação da mais-valia que o capital procura engrandecer-se. É também pela via da exploração e do trabalho que o capital expande a sua capacidade destrutiva aos sub-sistemas terrestres, pilhando a qualquer custo tudo aquilo que o rodeia e que lhe permite o aumento do lucro. Não é possível conciliar a sede de lucro com as mudanças estruturais necessárias. Daí que o trabalho seja a base para a transformação e, por isso, a revolução terá de ser profundamente revolucionária e ecológica.

Devia ser de estranhar o aproveitamento pela ala mais reacionária da burguesia da questão ambiental. O melhoramento dos sistemas ambientais tem de ser incansável e tal não é compatível com a procura insaciável pelo lucro. A verdade é que, a pretexto do fim do mundo, surgiram movimentações notáveis por parte da juventude em jornadas de luta, mais ou menos organizada, contra a chamada crise climática. Aquilo que à primeira vista parecia ser a força e vontade da juventude para transformar o mundo, veio a revelar-se como sendo apenas mais um jogo, uma distração orquestrada pelo grande capital, fazendo de milhares de jovens marionetas no seu teatro. Basta olharmos à nossa volta, abriu-se espaço ao fecho da Refinaria de Matosinhos e da Central de Sines, ao desemprego e à miséria de milhares de famílias, homens, mulheres e jovens, ao greenwashing das mais famosas empresas de moda, da escravatura nos campos agrícolas do Alentejo, até aos currículos que sufocam a juventude com a ideia estapafúrdia de que a culpa é do trabalhador, e não do sistema em que este se insere. Tudo isto a troco de mais emissões, que passarão a ser importadas. Curioso é observarmos que nem nas emissões de gases com efeito estufa somos soberanos, até isso temos de importar…    As maiores empresas são responsáveis por cerca de 70% das emissões de carbono, mas a culpa é de quem só recebe o suficiente para comprar o mais barato, de quem vê o salário a chegar a não chegar para o mês todo, das mulheres e homens que têm 2 ou 3 empregos para sustentar a sua família. A culpa é da Maria, que tem de ir de carro para o trabalho porque a carreira só oferece um horário a meio da manhã e outro ao final do dia. A culpa também é do João, que não pode deslocar-se de bicicleta, pois é demasiado preguiçoso para ir até ao seu trabalho. E por aí adiante…

A cultura do individualismo e do canibalismo social interessa ao capital e promove indiretamente a degradação ambiental, o conformismo e a incapacidade de se quer projetar uma mudança. É curioso pensar, por exemplo, nas correntes artísticas do século XX, da qual destacaria o Futurismo. O Futurismo, baseado na expressão do movimento, da velocidade e da evolução tecnológica, manteve uma relevância que surge da vida material para a matéria artística e da matéria artística volta a enraizar-se na sociedade até aos dias de hoje. A ação individual não é capaz de satisfazer o desejo de mudança que o ser humano tem, porque não é rápida o suficiente. A conclusão? A desmotivação torna-se preponderante e por sua vez a inação acaba por reinar. Isolados, sem organização, sem a orientação das massas trabalhadoras para a transformação consequente, o grande capital tem total liberdade para impingir tal inércia que não é possível efetivar qualquer mudança significativa que seja. Essa é a história da vida e da ciência, foi da conjugação de átomos em moléculas, de moléculas em tecidos e por aí continua, até que foi possível transformar-se a quantidade em qualidade, e vice-versa. Só assim se pôde evoluir efetivamente.

As alterações climáticas e a possível falência dos ecossistemas e do capital natural prejudicam principalmente quem trabalha. Serão os trabalhadores, a classe oprimida, explorada e mais vulnerável que sofrerá as consequências de um mundo mais poluído, com solos menos aráveis, com água menos potável, com a água remanescente privatizada, com ciclos desregulados, com serviços públicos deteriorados e sobrecarregados, com a tecnologia ao serviço do lucro, e não da humanidade e dos trabalhadores.

Para se conseguir atingir o equilíbrio entre a sociedade e o ambiente é necessário uma rotura com as bases sobre as quais a civilização (ou barbárie) foi construída. É necessário romper de vez com a classe e abraçar a igualdade, a fraternidade e o trabalho como as fontes do erguimento da sociedade socialista. Urge rumar ao comunismo, sem classes, sem exploradores ou explorados, urge uma sociedade de profunda harmonia e equilíbrio entre o ser humano novo e a Natureza, em que a tecnologia esteja ao serviço dos povos, sem donos e sem preconceitos, sem imperialismo, em que o sonho e a paz comandem verdadeiramente a vida.