Comunista não entra

Nacional

O executivo da Câmara Municipal do Porto, liderado por Rui Moreira, decidiu recusar o pedido da CDU para a cedência do Teatro Municipal Rivoli ao Conselho Português para a Paz e Cooperação (CPPC), para a realização de um concerto pela paz, sustentando a decisão dizendo que se tratava de uma iniciativa que era “promovida sob a égide de um partido político que tem vindo a branquear o hediondo ataque da Rússia à Ucrânia”. Se poderíamos pensar em algum momento que desvendada estava já a ampla campanha anticomunista que teve lugar nos últimos meses, que muitos empolaram cavalgando no seu saudosismo emocional para alimentar uma nova fase antidemocrática, estávamos profundamente enganados.

Rui Moreira faz o favor de instigar essa mesma sanha com, no mínimo, uma preocupante decisão, assente ainda em pior argumentação, prestando um miserável favor à democracia que o próprio aqui há uns anos manifestou a sua preocupação pela sua saúde e durabilidade. De pouco vale que se exija que um presidente de um município seja democraticamente esclarecido e verticalmente sério, quando perante afirmações como as do Secretário-Geral do Partido Comunista Português ou do seu Comité Central (saquemos desde já da institucionalidade da organização, para que se entenda que é a posição do Partido e não entrem já outros em devaneios difamatórios), e impossíveis de deturpar como e passo a citar, “a quem serve a guerra? Não aos ucranianos, nem aos russos, nem tão pouco aos restantes povos europeus” ou “o PCP não apoia a guerra e isso é uma vergonhosa calúnia”, se mantém um argumentário intencionalmente mentiroso.

Mas voltemos para avançar depois. Rui Moreira, em 2017, numa conferência mostrou-se agastado com o actual estado da democracia portuguesa, revelando profundas preocupações com a mesma. As suas inquietações, bastante demonstrativas do seu pensamento democrático, diga-se, levaram-no a considerar que se nada fosse feito em relação à fragilidade do processo democrático português, o regresso a uma possível ditadura poderia ser o caminho para pôr cobro a um estado falido de políticas e disciplina, rematando por cima que se um caminho alternativo como o de uma democracia directa (imagine-se à imagem de assembleias populares) fosse o cenário em aberto, este seria muito mais perigoso do que o de uma ditadura, isto é, corporativismo e fascismo antes de povo e liberdade. Apresentou um terceiro caminho, cenário equiparado ao cenário pós-guerra, numa profunda reformulação dos partidos políticos e das suas linhas orientadoras, surgindo uns e desaparecendo outros, que ao dito nem arriscaremos a dizer quais seriam estes últimos.

Naturalmente à posição de classe plasmada nesta análise, começamos por perceber que estamos de facto, comunistas e ruis moreiras desta e doutras vidas, em lados diferentes da barricada, lados cavados a fundo como senão bastassem os oceanos ideológicos que nos separam, quando Rui Moreira afirma no mesmo fórum que “quando o Salazar chegou ao poder ele criou o nome ditadura nacional e não era nada insultuoso”. Era insultuoso, sim. Era e foi insultuoso para comunistas e democratas que se opuseram tanto ao golpe militar de 28 de maio como a todo o período do estado novo, e, isso coloca-nos em lados opostos no que a Abril toca. Nós do lado de 1974, Rui Moreira do de 1973.

Perspectivado que está o entendimento de como se deve defender a democracia portuguesa e de que sendo inevitável por onde esta avançará com menos perigo, se para uma ditadura se para uma democracia directa, é importante entender os graves contornos da decisão de rejeitar o pedido para cedência de um espaço de uma organização política, com representatividade nos órgãos da autarquia a que preside; bem como, de sustentar a sua decisão em mentiras (sobre o PCP apoiar a guerra ou a Rússia ou a Putin), e, em inconstitucionalidades, que é sempre tempo oportuno para (re)lembrar a Rui Moreira, que o que para ele é incompreensível como a posição do PCP sobre a NATO, o diz e afirma também a Constituição da República Portuguesa, no seu artigo 7º sobre a “dissolução dos blocos político-militares”, voltando a colocar Rui Moreira do lado errado, mas sabemos bem o que vale a CRP para uns e para outros.

Se o inimigo é a paz é então certo e sabido que o PCP e os comunistas estão do lado do inimigo, deste inimigo que é a paz, porque sabemos também que quem está com a NATO está com o seu satélite que é a guerra, esta e todas as outras, e, portanto, é a única forma de conceber esta interpretação de Rui Moreira como correcta. Parece óbvio uma vez mais que estamos, como afirma Rui Moreira, de lados opostos, nesta e noutras questões. Na concepção da vida, na concepção da democracia, da liberdade e da paz, ainda bem que assim é. Não dormiríamos tranquilos se promovêssemos nós o delito de opinião, ou a política do pensamento único.

Comunistas não entram no Rivoli, pelo menos até o efémero Rui Moreira sair dos destinos da cidade do Porto, mas não sairemos da rua e povo portuense soube dar essa resposta na Praça D. João. E, certamente todos os democratas de Abril se mostrarão solidários com o PCP e se insurgirão pare que este não seja mais um caso calminho, de anticomunismo primário e de tempos fazendo lembrar outros.

3 Comments

  • Maria Dulce Santos Baudouin Montes Pereira

    31 Março, 2022 às

    25 DE ABRIL SEMPRE
    FASCISMO NUNCA MAIS

  • Jorge Nunes

    30 Março, 2022 às

    Por todos estes motivos e muitos mais, decidi, por agora, boicotar todo o tipo de informação vinda de canais portugueses (incluindo jornais), «promovidos sob a égide de uma classe de ignorantes pragmáticos que tem vindo a branquear os crimes cometidos pelo exército ucraniano contra civis e prisioneiros russos, bem como a clara evidência de nazismo no regime do presidente Zelesky».

    Para mais exemplos do nazismo na Ucrânia, é ver este caso no centro comercial de Horodok em Kiev:

    https://www.timesofisrael.com/staircase-in-ukraine-mall-decorated-with-giant-swastika/

  • Diclinda Baudouin

    29 Março, 2022 às

    Mais uma ignominiosa decisão…Povo do Porto, não permitis que vos agrilhoem…
    Liberdade, sempre.E 25 de ABRIL também.

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