De Mossul à Babilónia: o triunfo da ignorância e da barbárie.

Internacional

Totalitarismo e ignorância andam quase sempre de mãos dadas. Quando a estes se junta o mais completo e absoluto desprezo pela história de outros povos e de outras territórios  que não são compreendidos para lá dos recursos naturais que guardam, a coisa torna-se dramática, quando não criminosa.

Do Iraque chegam notícias da destruição de estátuas e peças arqueológicas de grande valor por parte de elementos do chamado “Estado Islâmico”. A antiga cidade assíria de Nimrud, situada no norte do Iraque, junto à actual Mossul, encontra-se em acelerado processo de destruição às mãos do grupo. Qualquer semelhança com os tristes acontecimentos do vale de Bamyian, no Afeganistão, não são mera coincidência. As semelhanças em todo o caso não se limitam ao âmbito exclusivo do fundamentalismo islâmico de inspiração saudita. O Iraque tem a lamentar a acção directa das tropas norte-americanas sobre locais históricos e arqueológicos de grande importância…

Após a invasão norte-americana do Iraque, em 2003, foi criada em cima de locais arqueológicos da antiga Babilónia uma enorme base militar ianque, o chamado “Camp Alpha”. A permanência de dezoito meses das tropas do império por cima dos restos do antigo Palácio de Nabucodonosor ajudaram a destruir os frágeis vestígios de uma civilização há muito desaparecida. Pavimentos com 2600 anos foram destruídos pelos pesados pneus dos veículos militares norte-americanos.

Relatórios da UNESCO, citados por fontes tão insuspeitas com o The Washington Post, referem a terraplanagem e a cobertura com gravilha de colinas pertencentes ao perímetro do antigo Palácio, com o objectivo de ali serem montados parques de estacionamento, alojamentos para as tropas e heliportos. Também referem que a montagem de cercas em torno do campo danificou de forma séria vestígios arqueológicos relevantes, como o antigo portão de Ishtar.

Outra fonte insuspeita – o nova-iorquino The New York Times – referia em 2006 que a UNESCO procurava recuperar artefactos roubados através do site de vendas eBay. Recordo histórias semelhantes a propósito da pilhagem de monumentos, museu e locais de interesse arqueológico na Síria, em 2013.

As origens da destruição que Estado Islâmico e Estados Unidos promoveram e promovem no Iraque são no fundamental as mesmas: desejo de domínio sobre o território iraquiano e sobre os seus recursos; desprezo total pela história e por culturas que não compreendem nem desejam compreender.

O que me intriga (ou então não me intriga nada, já nem sei) é a forma escandalizada como alguma imprensa reage à destruição promovida pelo “Estado Islâmico” quando na verdade a terraplanagem dos vestígios arqueológicos da antiga Babilónia teve como “banda sonora” o silêncio quase total por parte de órgãos de comunicação social fortemente empenhados no esforço de guerra da “coligação” liderada por George W. Bush e os seus parceiros amestrados.