Intoxicação de guerra

Internacional

Nos últimos dias, na devastada cidade síria de Aleppo, tem ganho progressivo espaço mediático o emocionante caso de uma menina de nome Bana Alabed, de sete anos de idade apenas, e que por via da rede social twitter, vem partilhando preocupações, apelos políticos e outras mensagens sobre o seu dia-a-dia na guerra.

O caso é que Bana é uma ficção. Bana é um produto tóxico inventado num qualquer laboratório ao serviço da guerra mediática, é uma ficção do império colocada ao seu serviço político e cuja divulgação percorreu as redes e meios da moda(primeiro nas redes sociais, seguida por uma rápida e global divulgação nos órgãos de comunicação social de “referência”).
Estórias como esta sempre houve e, francamente, não valeriam grande atenção não se dera o caso desta Bana ter tido honras de
Telejornal da RTP, e veja-se com atenção toda esta peça. Tornando-se em mais um caso, que se soma a tantos outros, de manipulação sobre a guerra na Síria na RTP. Sendo que Bana é, ainda por cima, uma boneca particularmente mal montada.

Aleppo está em guerra há mais de 4 anos, é uma cidade tomada, saqueada e devastada pelos sucessivos grupos terroristas(animados, financiados e munidos por EUA/NATO/UE, pela Turquia entre outras potências regionais) do Daesh à Al-Nusra, dos “rebeldes” aos “insurgentes”, dos “jihadistas” aos “jihadistas moderados”, entre outras mutações nominativas que estes grupos vão assumindo…mas importa que é uma cidade absolutamente destruída. Assim, estranha-se na vida de Bana:

1- como vive e se mantém a viver na cidade, numa zona “controlada pelos rebeldes”?

2- como se mantém ligada constantemente à internet sabendo-se que por lá não existem elementos civilizacionais básicos como a electricidade ou água?

3- como tem e para que tem uma criança de 7 anos um telefone de tecnologia 3G em zona de guerra?
4- como podem neste cenário existir redes de telemóvel e internet?

5- como fala e escreve tão correctamente em inglês uma criança síria de 7 anos(4 deles em guerra)?
6- porque nunca em 415 mensagens escreveu ou falou na sua língua nativa?

7- como sabe ela os nomes de diversos presidentes como Putin(ela ao Assad liga pouco) ou Obama e ainda instituições como o Tribunal Penal Internacional(com sete anos apenas ela já conhece o TPI)?

8- como conhece e porque já se corresponde via twitter com outras crianças “vítimas” de Putin como os pequenos ucranianos e arménios Vadim Dovganyuk e Elena Hagoyan?

9- é notável a pontualidade nos bombardeamentos e o talento cinematográfico de sua mãe(que não a protege, antes a filma à janela enquanto ocorre um bombardeamento);

Esta contagem rápida de situações estranhas podia continuar com muito mais questões. Mas o mais relevante, agora, não é a personagem Bana, mas sim a relevância dada pela RTP a esta aldrabice pegada.

É absolutamente lamentável que as senhoras “jornalistas” Ana Rita Freitas e Sara Cravina, como duas baratas tontas tenham editado e reproduzido uma peça cujos dados não são delas(antes são de alguém que os inventou, que construiu as imagens e  uma narrativa que elas devoraram) e sobre os quais não fizeram qualquer fact-checking, qualquer verificação sobre a sua veracidade. Assim, acefalamente, para adjectivar por baixo, no mínimo, assinaram e mandaram para o ar na estação televisiva de serviço público, em pleno Telejornal(entre outros espaços de “informação” em televisão do grupo RTP), 2 minutos de mentira e intoxicação pura.

A direcção de informação da RTP desde o início da guerra na Síria, em 2012, tem tido um linha editorial perfeitamente enquadrada com a “informação” e opinião construídas e formatadas por agências e outros veículos de produção de conteúdos para os mass media internacionais, que naturalmente servem os objectivos políticos e de narrativa mediática do império, dos EUA/NATO/UE, distribuindo todo esse material desinformativo e objectivamente tóxico por este mundo fora.

O director de informação da RTP, o ascendente ainda que curto, mal formado e patusco, Paulo Dentinho, já esteve na Síria e entrevistou pessoalmente Al-Assad, conheceu aquela realidade, a de uma guerra já desenvolvida e cujos traços essenciais nos planos militar e mediático eram notórios, sendo, portanto, indesculpável a opção editorial da RTP e da sua direcção de informação. Este director e esta direcção, nesta opção que fazem, colocam-se no papel de cúmplices em toda a intoxicação que se serve regularmente aos tele-espectadores sobre a guerra na Síria, sendo este ridículo caso de Bana apenas mais um triste episódio.

* Autor Convidado
Filipe Guerra