Natal em Caracas

Internacional

Há muitos anos atrás, num país cuja tradição natalícia é o pernil de porco, os estômagos dos miseráveis das favelas não provavam mais do que hallacas. Do porco, só os restos que acompanhados de algum frango e vaca eram embrulhados com as azeitonas, passas e alcaparra em massa de milho. Depois, era tudo isto coberto por folhas de bananeira. Na Venezuela, a operação de feitura das hallacas é ainda hoje um hábito que envolve todas as famílias nas noites que antecedem a véspera do natal. Antes, o único momento em que os pobres da cidade viam um pernil de porco era quando a empregada o levava para a casa dos ricos.

Em 1989, o povo venezuelano levantou-se contra o FMI e o seu governo. A revolta foi esmagada pela repressão e caíram milhares de mortos. Três anos depois, Hugo Chávez comandava um golpe militar para derrubar a oligarquia que mandava a partir do Palácio de Miraflores. Foi derrotado mas o povo não esqueceu. À saída da prisão, milhares de pessoas acompanharam-no à tumba de Simón Bolívar. Seis anos depois, o menino pobre de Sabaneta era eleito presidente da República.

Uma semana antes do natal, o Gustavo pediu-me que o acompanhasse. Numa das principais ruas do centro de Caracas, estava apostado um palco em que soavam as típicas canções salseras. Animados, milhares de pessoas esperam numa fila pela sua vez para comprar pernil de porco a metade do preço. Ao lado, um mercado popular a preços regulados permitia que todos pudessem rechear as cozinhas e oferecer aos seus filhos aquilo que não haviam tido nos natais em que governava o FMI. Pela força da luta, o natal era para todos.