O discurso “pós-político” da direita

Nacional

Desde que foi apeada do poder, onde se propunha continuar a infernizar a vida aos portugueses que vivem do seu trabalho (ou que sobrevivem por não ter trabalho), a direita tem-se servido do argumento da politização da política para atacar aspectos particulares da acção do actual governo, em especial aqueles que têm sido concretizados com o voto favorável dos partidos à esquerda do PS. Não se trata de coisa nova: basta recordar a célebre tirada de Victor Gaspar na AR, quando em resposta a uma deputada fez questão de recordar que, apesar de ser o mais influente membro do governo de Pedro Passos Coelho, não havia sido eleito “coisíssima nenhuma”.

Seja como for, o argumento é fácil e gera ruído potencialmente absorvível por muitos daqueles que, desatentos ao que têm sido estes meses pós-“PUF”, tomam como bom o argumento de que é ilegítimo politizar questões como as políticas em torno do sector do turismo, a tentativa de moralizar os contratos de associação ou o (aparente) ponto final colocado sobre a farsa dos exames nacionais nos ciclos mais precoces do sistema de ensino.

Tudo no debate público é, de uma certa forma, política. E aqueles que, com base em programas políticos foram eleitos para dar corpo às promessas formuladas, fazem-no por razões que são na sua génese políticas. O argumento das inevitabilidades foi pelo ralo, juntamente com o governo de Passos e Portas, aqueles que a partir de determinada fase da governação – depois de esfumado o discurso “alegremente além da troika” – apresentaram toda e qualquer das muitas medidas anti-populares e anti-patrióticas tomadas como parte de uma via única e inevitável que se viam forçados a seguir. Os caminhos são vários e dão corpo a perspectivas – desde logo ideológicas – sobre o desenvolvimento que se pretende (ou não…) para o país. Aspectos de natureza técnica são naturalmente relevantes, mas servem – na construção, implementação e avaliação – as decisões políticas a tomar ou tomadas.

O discurso aparentemente “pós-político” da direita foi campo fértil durante muitos anos para o ascendente que a economia e a finança conseguiram face às instituições do Estado. Ele foi aliás instrumental no fortalecimento da burguesia ao comando do aparelho repressivo, coercivo e administrativo do Estado, que longe de ser “todos nós” é antes uma ferramenta de dominação de classe de que os pretensos “donos disto tudo” (que não são uma única pessoa ou grupo económico…) tomaram conta faz muito tempo. Cabe-nos por isso procurar esclarecer aqueles que forem na conversa da política sem política, género de tatcherismo à portuguesa.