Há uns anos atrás, quando inauguraram a sempre caótica rotunda do Marquês de Pombal, um curioso que por ali passava atreveu-se a fazer uma pergunta que não havia ocorrido a qualquer um dos responsáveis técnicos e políticos da obra. Onde estavam os sumidouros para escoar a água? Entre o gaguejo demagógico do típico discurso fingido, os autarcas apressaram-se a garantir que estava tudo pensado. É este o nível de profissionalismo de quem está a governar uma cidade para os interesses privados. Mas antes de se especializar em afogar Lisboa e responsabilizar o Instituto Português do Mar e da Atmosfera pela falta de previsão, António Costa já existia.
Existia nos rostos curtidos de quem não tinha dinheiro para alimentar os filhos. Nessa altura, o nome do ministro da Administração Interna sabia à saliva que se cospe quando se está fodido. Durante anos, os trabalhadores da MB Pereira da Costa não arredaram pé e a resistência alcançou para mostrar que ninguém enriquece a trabalhar. Da Amadora, nunca faltou a solidariedade dos comunistas e da população. E do que se diz futuro primeiro-ministro nunca faltaram as bastonadas e as detenções. Recordo-me do dia em que a polícia cercou a zona, se lançou sobre nós como animais para depois levar preso um sindicalista. Meses antes, o patrão havia contratado um grupo de capangas armados para romper a resistência. Não conseguiram. Depois, veio a polícia de choque de António Costa.
Mas antes da MB Pereira da Costa, António Costa já era conhecido na Amadora. Existia nas barricadas de revolta que levantaram os operários que durante décadas nos construíram as carruagens dos comboios e do metro. Essa raiva que crepitava todas as noites nas fogueiras de quem vigiava as entradas da Sorefame para a defender de quem a queria desmantelar. Mas, sobretudo, António Costa existia nas marcas que deixaram os cassetetes da polícia sobre os trabalhadores e a população. E agora que já não há Sorefame nem MB Pereira da Costa, é sobretudo um insulto que alguém se pergunte sequer se António Costa é uma alternativa ao esgoto em que PS, PSD e CDS-PP, ao serviço dos bancos e das grandes empresas, nos afundaram.