“O senhor diz que uma série de pessoas saíram do RSI, esquece-se de dizer que essas pessoas deixaram de ter rendimento mínimo porque, por acaso, tinham mais de 100 mil euros na conta bancária.”
De quem é esta frase? Do vice-primeiro ministro, Paulo Portas. A afirmação é verdadeira? Não. Então porque se sente no direito de mentir o vice-primeiro ministro Paulo Portas? Mais, porque se sente no direito de mentir em pleno Parlamento?Porque se sente impune e porque uma das maiores e mais eficazes armas que este governo utiliza é a mentira descarada e a manipulação dos números. Esta arma não é nova, e nem sequer exclusiva deste governo, digamos que, principalmente, desde os tempos do cavaquismo, ela tem feito o seu caminho e ganho a sua importância.
A par da mentira tem andado sempre a corrupção, seja de Estado, praticada no momento em que se tem responsabilidades de governação, seja pessoal, havendo a necessidade de chegar a um cargo de responsabilidade política para mais facilmente se encobrir a ilegalidade. E aqui tenho de tirar o chapéu aos 3 partidos do “arco da exploração”, PSD, PS e CDS. Construir e aperfeiçoar um sistema que permite que com o passar do tempo se minta e corrompa cada vez mais com menos consequências políticas e judiciais dá trabalho e tem de ser feito com muita cabecinha. O BPN foi e será sempre uma obra-prima.
Um terceiro factor desta equação é a forma como se está nos cargos. É suposto que se tenha um comportamento ético no tratamento e no pronunciamento das questões políticas. E se durante o cavaquismo ainda se tentava manter a aparência do que que se pode chamar “sentido de Estado” – que permite que muitos digam à boca cheia que Cavaco Silva é um estadista, cruzes canhoto… -, também é verdade que foi nesses governos que se criaram as bases para que a ética começasse a ser uma batata, e cheia de grelos.
Durante o caminho alguns tiveram de dar o corpo às balas, só assim o sistema continua a funcionar, porque de quando em vez é preciso dar a ideia de que a Justiça e a responsabilidade política existem, funcionam e chegam a todos e todas. Um ministro apanhado a contar uma piada sobre hemofílicos, um governador de Macau apanhado a calçar umas “luvas” bem caras, um secretário de estado e presidente de câmara que parece que tinha uns dinheiros na Suíça “emprestados” a um sobrinho taxista e à sua mulher cabeleireira, um ministro que no dia em que caiu uma ponte se demitiu assumindo a responsabilidade política e mais uns poucos casos, manifestamente poucos, em que por terem mentido, corrompido ou deixarem-se corromper, ou não terem tido um comportamento ético, ministros, secretários de estado, presidentes de câmara, administradores de empresas públicas, etc, se demitiram e/ou tiveram que arcar com as consequências políticas e judiciais dos seus actos.
No actual governo já tivemos de quase tudo e em quase todos os ministérios. Mas Paulo Portas desta vez abusou, e se o significado da palavra “irrevogável” não tivesse sido revisto pelo próprio, tal mentira não mereceria outra coisa que não uma irrevogável demissão.
Perante a montanha de mentiras, corrupção e ética duvidosa em que se transformou este governo, os cornos do ex-ministro Manuel Pinho na AR, que o levaram a pedir a demissão no próprio dia, são apenas um fraco quadro de Revista à Portuguesa.
* Autor Convidado
André Albuquerque