Um comunista, ao contrário de um membro do PS, do PSD ou do CDS-PP, vive sob um código moral que não precisa de ser escrito nem dito, mas que todos esperam que cumpra. Um comunista não lixa o colega de trabalho, sente, por instinto, repulsa pelo luxo e faz da humildade uma bandeira verdadeira. De um comunista até os membros de outros partidos todos esperam generosidade, seriedade e verdade. Se alguém do PS se cruza com uma injustiça e vira a cara para não ver, está no seu direito, não era nada com ele. Se um comunista fizesse o mesmo, alguém no café diria «é muito comunista, é muito comunista, mas pode ver um gajo na merda e está-se a cagar». E diria bem. Porque ser comunista não é só ser membro de um partido e lutar por um mundo novo: é aceitar voluntariamente o dever formidável de ser o exemplo vivo, militante, pessoal, diário e tangível da superioridade desse ideal. É por isso que já ninguém se surpreende quando um ministro do PS vai trabalhar para uma empresa que privatizou mas nos chocaríamos se um militante comunista exigisse ser tratado por «doutor». Os comunistas julgam-se por critérios superiores.
A superioridade moral dos comunistas não tem qualquer segredo nem os militantes do PCP são seres humanos diferentes dos outros. Mas num país em que todos os partidos abdicaram da ideologia (pelo menos abertamente), só o PCP defende um ideal nomeável com que se possa confrontar os seus militantes. Ninguém, em nenhuma circunstância, ao balcão de nenhum café, diria algo semelhante a «Já viste? Esse gajo, tanta conversa sobre a social-democracia… Transferiu a massa toda para um offshore nas Bahamas!» ou «Que vergonha! Uma gaja que se diz neo-liberal e tem os trabalhadores com salários em atraso!». Já os comunistas têm um ideal que até a direita associa a princípios elementares de justiça.
É por esta razão que, não sendo diferentes dos outros seres humanos, é tão raro, e por isso surpreendente, conhecer militantes comunistas mentirosos, sobranceiros, corruptos, carreiristas ou oportunistas. No PCP não há empregos, confortáveis tachos nem altos voos políticos: só há trabalho militante e sacrifícios pessoais que, tão grandes que são, só os suporta quem lhes ama a razão e os consegue fazer com um sorriso. Sem esperar nada em troca, a não ser a alegria cheia de nos sabermos parte da luta pelo que é justo.