Assistimos hoje, em Gaza, a um genocídio com a aprovação da comunidade internacional, tão pronta, noutras ocasiões, a decretar pesadas sanções e ameaças e tudo o resto que faça tremer de medo os media ocidentais. Mais nada. Sejamos realistas, as sanções económicas são o pior que pode haver para quem ainda tem alguma coisa a perder. Porque nunca estas sanções afectam os que deveriam ser realmente os alvos.
Obviamente, ninguém com dois dedos de testa espera, no actual panorama da política internacional, com as movimentações de interesses geopolíticos a que temos assistido às portas da Europa, que surja um bloqueio a Israel. Ou que apareça qualquer coisa a condenar Israel pelo genocídio que está a efectuar em Gaza.
A ONU “suspeita que estejam a ser cometidos crimes de guerra por Israel”, ao mesmo tempo que uma deputada sionista defende o assassinato das mães palestinianas e um ex-responsável da Mossad considera que a violação de mulheres palestinianas é o caminho para atemorizar possíveis suicidas.
Objectivamente, não me identifico com sistemas que tenham como base qualquer referência à religião. Desde o feudalismo dos monges do Tibete aos estados islâmicos, passando pelo israelita até aos EUA. Não há democracia quando se mistura vida de pessoas com crenças.
Mas – cá está ele, há sempre um – não podemos ficar indiferentes ao que está a suceder em Gaza e ao que tem vindo a acontecer na Cisjordânia. A Cisjordânia, para além de estar a ser povoada pelos chamados colonatos israelitas, alguns verdadeiras cidades, tem dentro do seu território, definido pela Green Line de 1949, um muro com cerca de oito metros de altura e que separa 450.000 palestinianos do seu território. Nesses colonatos –considerados ilegais à luz da lei internacional – vivem mais de meio milhão de israelitas. Tudo com o apoio dos EUA, Inglaterra e França, tendo em conta a necessidade de garantir a instabilidade de uma zona do globo que faz movimentar milhões inimagináveis na indústria do armamento.
A construção do Muro do Apartheid foi considerada ilegal pelo Tribunal Internacional de Justiça, em 2004, mas continua a decorrer.
Em Gaza vivem 1.800.000 pessoas em menos de 350km2. É, desde 1948, um campo de refugiados. Está bloqueada e alguns dos túneis para o Egipto, se poderiam servir para tráfico de armas, também eram fundamentais para a sobrevivência daquela população.
O que está a acontecer em Gaza é um genocídio e o Holocausto não pode desculpar tudo. Aliás, devia ser a lembrança dos horror do Holocausto a levar um bocadinho de humanidade aos governos de Israel e aos imbecis que, por cá, tentam justificar o massacre indiscriminado de civis com a guerra ao terrorismo.
Ninguém pode ficar indiferente às imagens do assassinato de um palestiniano que procurava familiares nos escombros de uma casa por um atirador furtivo. Ou às três crianças assassinadas numa praia. Gaza está cercada e quem lá sobrevive está a ser assassinada. E para isso não há desculpa.
Numa entrevista, foi perguntado a um militante do Hamas se considerava que o movimento tenderia a acabar, com o surgimento de movimentos de resistência pacífica. Se tentava falar com os jovens que eram seduzidos pela ideia e levá-los para a causa do Hamas. A resposta foi clara.
– Não falo com eles, não preciso. Quando virem um bulldozer arrasar as suas casas, quando virem os seus familiares mortos, são eles que vêm ter connosco.
E pode condenar-se? O que faria cada um de nós, de cada vez que víssemos cair um filho, um irmão? Sim, o Hamas é uma organização islâmica que não defendo. Creio que deixei isso claro mais acima. Mas é no Hamas que a revolta palestiniana se exprime. E podemos mesmo, imaginando que nascemos, crescemos e morremos num campo rodeado de violência, humilhados pelos checkpoints israelitas em territórios da Palestina, afirmar que nunca o faríamos?
Não. Ninguém pode. Ou antes, podem os hipócritas do politicamente correcto. Porque só é mesmo pacifista quem pode dar-se a esse luxo.