Todos os artigos: Internacional

A culpa é do sistema

Sérvia, Europa, Janeiro de 2017

Os agradecimentos aos construtores da União Europeia sucedem-se, nos últimos dias. Afinal, como não agradecer a quem nos atirou dinheiro a troco daquilo que, achávamos nós, era nada? Há melhor incentivo? Claro que não havia outro caminho, nunca há outro caminho. É aquele discurso das inevitabilidades que tão bem conhecemos. Ficámos com estradas que levam a lugar nenhum, porque recebemos dinheiro para modernizar as infraestruturas do país, mas ficámos sem ter o que transportar, porque também recebemos para não produzir, recebendo de fora o que produzíamos, mas não importa. Enquanto houvesse obras públicas, havia de haver emprego. Obra feita, pois claro. Nem pescas, nem agricultura, nem indústria, mas os gigantes da Europa fizeram o favor de nos dar dinheiro. Que agora pagamos com todos os juros, financeira e economicamente.

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Catorze anos sem Joe Strummer

Escrevi-o há quatro anos e creio que continua actual. Há 14 anos, um ataque cardíaco roubou-nos a mais emblemática figura do punk. Quando Joe Strummer foi encontrado sem vida, poucos meses depois de cumprir 50 anos, houve quem arriscasse que havia sido vítima de overdose. Para os que não seguem este género musical, ele é sinónimo daquele niilismo violento que tem a destruição da sociedade como meta. Por isso, a imagem de Joe Strummer derrotado pela dependência seria a consequência lógica de um adereço com que se gosta de vestir o punk. Contudo, o vocalista dos The Clash foi um dos protagonistas do resgate político que vários grupos encetaram para derrubar os muros que separavam os jovens punks da capacidade de sonhar. O mérito de Joe Strummer foi o de dar sentido à violência anti-sistema como resposta a problemas sociais e com a visão de um futuro melhor. Os palcos onde tocavam os The Clash não eram mais do que a continuação da revolta por outros meios. Isto nos tempos de Margaret Thatcher.

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Armas de intoxicação massiva

Qual é a diferença entre um terrorista em Paris, um saqueador em Palmira ou um sanguinário em Aleppo? É que se ele estiver em Aleppo, na grande imprensa, não terá nenhum destes adjectivos e será apenas um “rebelde” ou um “insurgente”, provavelmente acrescentarão ainda que é “moderado”. É o que tem acontecido.

A grande comunicação social construiu uma gigantesca e sinistra distopia mediática em que um mercenário de guerra fanatizado é apresentado como um “rebelde moderado” que luta por liberdade e democracia  ao passo que simultaneamente um soldado sírio que arrisca a própria vida pela libertação de uma cidade do seu país se vê transformado num carniceiro contra o seu próprio povo capaz de bombardear o vigésimo-sétimo “último hospital para crianças” de Aleppo.

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Nem uma menos

A revolta invadiu o bairro Bosque Calderón, uma das zonas mais pobres de Bogotá, onde vivia Yuliana Samboní. Esta menina colombiana de sete anos foi raptada por um abastado arquitecto. Depois, Rafael Uribe Noguera torturou-a, violou-a e matou-a. Há quatro anos, também na capital colombiana, Rosa Elvira Cely havia sido brutalmente violada num parque por dois homens. Morreu quatro dias depois nas urgências do hospital com os órgãos internos destruídos pelos ramos de árvore que usaram para a violar.

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O choque da pobreza cubana

A morte de Fidel foi mais um pretexto para a o avanço da ideologia dominante na propagação da ideia de que ou há este caminho ou não há caminho nenhum. Da social-democracia mais à esquerda ou mais à direita, poucos são os que têm coragem de assumir que as conquistas cubanas são tão profundas e importantes que não podemos compará-las com as democracias haitianas, porto-riquenhas ou dominicanas. É que, por incrível que possa parecer, é com esses países que Cuba deveria ser comparada. Porque foram países brutalmente colonizados, explorados nos seus recursos e nos seus povos. Porque era lá que os homens de família que deslocavam em negócios de saias, enquanto enchiam a boca com o moralismo e a santa madre igreja. No entanto, o progresso cubano foi tão expressivo que o comparamos com os países desenvolvidos, ou exploradores, como preferirem. E, por incrível que possa parecer, Cuba supera esses países em categorias tão importantes como a saúde infantil, materna, educação, tratamento do HIV, acesso à habitação. Mas o que importa isso?

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Fidel e eu [texto originalmente publicado a 22.03.2016]

A visita oficial do presidente dos Estados Unidos da América a Cuba é um momento particularmente sensível no debate político e ideológico no plano nacional e internacional. Contra os comunistas portugueses, por exemplo, são arremessadas as velhas e gastas acusações de sempre, todas elas enganosas e aldrabadas, todas elas desmascaradas pela realidade.

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O delírio “europeu”

O parlamento europeu discutiu recentemente uma resolução sobre medidas a adoptar pela “Europa” (leia-se, pela União Europeia) contra alegada propaganda russa contra “os valores europeus” e “a democracia liberal”. Num debate feito à sombra do progressivo colapso “da Europa”, uma boa parte dos eurodeputados optaram por justificar a desconstrução em curso da União Europeia com um dedo apontado aos inimigos externos, com a Rússia em primeiro plano.

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