Uma viagem ao coração da resistência irlandesa (1ª parte)

Sob o céu carregado de Falls Road, no cemitério de Milltown, não se ouve mais do que a gravilha debaixo dos nossos pés. Há muitos anos, o demencial ataque de um lealista fez vários feridos enquanto a população republicana de Belfast enterrava um dos três membros do IRA abatidos pelas forças especiais do exército britânico em plena luz do dia nas ruas de Gibraltar. Lançou granadas e disparou sobre os civis que prestavam a última homenagem aos seus heróis. Em fúria, perseguiram-no e entregaram-no à polícia. Pior sorte tiveram os dois soldados britânicos que, três dias depois, vestidos à civil se atravessaram de carro em frente a uma das marchas fúnebres. O veículo foi cercado pela raiva das centenas que choravam os seus mártires enquanto os militares disparavam para tentar dispersar a multidão. Arrancados à força, foram linchados e entregues ao IRA que os abateu. As imagens dos acontecimentos encheram telejornais do mundo inteiro e Margaret Thatcher afirmou que havia sido o crime mais hediondo durante a sua legislatura. A hipocrisia de uma primeira-ministra que largou milhares de trabalhadores no desemprego e na miséria, que levou o sabor da morte às Malvinas e que deixou morrer os dez grevistas de fome do IRA e do INLA.

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Direita «observadora» e Constituição

Não é novidade para mim – já o tinha escrito algures – que a próxima grande batalha da direita portuguesa – que não resume aos partidos mas também e sobretudo aos interesses e corporativismos dominantes – consistirá, invariavelmente, na tentativa de derrube da Constituição da República Portuguesa. Como sabemos, para «suavizar» as pancadas, a direita especializou-se em atribuir designações falaciosas aos seus intentos mais macabros. Da mesma forma que, entre muitas outras coisas, o «ajustamento» nunca foi ajustamento nenhum, nesta questão em concreto também não é de «revisão» do texto constitucional que estamos aqui a falar. É mesmo de derrube, de destruição, de subversão, de completa capitulação de o que resta da democracia e da vontade do povo às leis «modernas» da finança, do economicismo e da ditadura do capital. E este “grande desígnio” é aliás uma questão de elementar lógica: se a Constituição foi, de forma muito particular nos últimos meses e anos, a grande salvaguarda e o último bastião da defesa daqueles que menos têm e menos podem – dos trabalhadores, dos reformados, dos pensionistas –, importa portanto eliminar essa «pedra no sapato» daqueles que, hoje como ontem, exploram, usam e abusam daqueles que, no fundo, à custa dessa exploração – cada vez maior e mais acentuada – lhes deram e dão o pão a ganhar.

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Vista grossa no Aleixo

A foto é antiga. Aqueles edifícios castanhos que se vêem na imagem, tirada a partir de Gaia, mostram o que era, antigamente, o Bairro do Aleixo. Bairro de má fama, mais ou menos como o comum mortal vê a Comporta para os ricos, estão a ver mais ou menos a dimensão da coisa? Hoje restam três torres, se não me falha a memória do fim-de-semana.

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O Inferno é a barca e as suas timoneiras

Fazer um programa só com mulheres para afirmar as mulheres na política é uma ideia interessante. Mas depois faz-se um programa com a) o Nilton, b) aquelas convidadas. Faz-me, por um lado, ter vergonha alheia não por achar que serão elas a bitola com que se vai avaliar o papel da mulher na política (não me parece, ou pelo menos espero que não seja esse o efeito) mas porque na discussão dos temas tudo se faz com uma displicência, ignorância e desconhecimento que não faz sentido nenhum. Por outro lado preocupa-me, porque, sendo a ignorância uma atrevida, a verdade é que quando as afirmações passam sem que sejam contraditadas, transformam-se em verdades.

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Do esclavagismo à segregação racial, a(s) raiz(es) da violência

Estima-se que a cada 36 horas um afro-americano seja assassinado nos EUA por alguém pertencente às diversas forças de segurança.

A acompanhar o número de assassinados, surgem muitos outros números que revelam uma situação de impressionante discriminação racial na aplicação de penas legais, seja o número de condenados a sentenças de prisão, a sentenças longas ou de condenações a pena de morte. (aqui)

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E se Portugal fosse governado como Loures?

Quem cresceu nos dormitórios suburbanos de Lisboa pode separar as memórias da sua cidade na incursão nos prédios que estão agora onde antes era só campo. Lentamente, como uma enxaqueca histórica, a especulação imobiliária apoderou-se das cidades, transformou-se nas cidades. Acompanhando a retirada das funções sociais do Estado, o poder autárquico timonado pelo PS e PSD reduziu-se à insignificância votada, não pelos eleitores, mas pelos sucessivos governos: a sina de estruturas democraticamente opacas que seguem mecanicamente procedimentos formais, que servem para cobrar taxas e, no compasso das eleições, tapar uns buracos.

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Guterres e a Constituição

Os “Frente a Frente” das 21h30 na SIC Notícias são frequentemente espectáculos tristes mas pedagógicos e reveladores da pobreza de ideias e de convicções de boa parte dos seus protagonistas. Desconfio que muito do que dizem não é certamente o que pensam, embora pensem que o devem dizer. Outra boa parte do que defendem resulta (só pode…) de pura ignorância ou, pior, consciente vontade de contornar o óbvio através de uma pirueta e meia seguida de mortal encarpado, verdadeiras olímpiadas do contorcionismo político.

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